A Influência do número de aplicações de fungicidas foliares na produtividade de lavouras de soja no Rio Grande do Sul


Autores:

Enrico Fleck Tura¹, Michel Rocha da Silva², José Eduardo Minussi Winck², Alexandre Ferigolo Alves¹, Felipe Schmidt Dalla Porta¹, Mauricio Fornalski Soares¹,
Daniel Debona³, Nereu Augusto Streck¹, Alencar Junior Zanon¹

Publicado em: 14/11/2023

O Brasil apresenta o maior potencial de produtividade de soja em lavouras não irrigadas (5.500 kg/ha) entre os três maiores produtores mundiais de soja (GYGA, 2023). Além disso, o país apresenta a maior oportunidade de aumentar a produção de soja na atual área agricultável, através da adoção de boas práticas de manejo, pois a lacuna de produtividade é de 2.400 kg/ha. Contudo, para reduzir a lacuna de produtividade, é necessário identificar quais são os fatores que causam perdas de produtividade nas lavouras de soja (LOBELL; CASSMAN; FIELD, 2009; VAN ITTERSUM et al., 2013).


Em soja, os fatores de manejo que causam a lacuna de produtividade já foram determinados no Corn Belt Americano e o controle de doenças aparece como o segundo fator que mais causa redução na produtividade (GRASSINI et al., 2015; MOURTZINIS et al., 2018; SHAH et al., 2021). Na Argentina, a aplicação de fungicidas aparece como o principal fator que causa lacuna de produtividade em lavouras de soja de segunda safra (semeadas após o cultivo de trigo) (DI MAURO et al., 2018). No Sul do Brasil, existem estudos incipientes com dados de lavouras que também apontam o manejo de doenças como um dos principais fatores que causam a lacuna de produtividade (SENTELHAS et al., 2015; TAGLIAPIETRA et al., 2021; WINCK et al., 2023).


Entretanto, os trabalhos realizados abordando o uso de fungicidas e doenças no Brasil, são conduzidos na quase totalidade em área experimentais, abordando fatores isolados, muitas vezes não retratando as interações que ocorrem em nível de lavouras (DALLA LANA et al., 2018; GODOY et al., 2016, 2023). Assim, a utilização de dados de lavoura aparece como uma alternativa para integrar os fatores de manejo nas análises, trazendo resultados que traduzem a realidade das lavouras e que podem ser efetivamente implementados pelos agricultores (ANDRADE et al., 2022).


Nesse sentido, o objetivo deste estudo foi quantificar a influência do número de aplicações de fungicidas sobre a produtividade de lavouras de soja no Rio Grande do Sul, Brasil, por meio da análise de dados de 1163 lavouras, avaliadas nas safras 2016/2017 até 2021/2022.


Através do uso de uma função limite entre número de aplicações de fungicidas e a produtividade das lavouras, foi observado um aumento de produtividade de 599,8 kg/ha para cada aplicação, entre uma e 4,2 aplicações (Figura 1). A partir de 4,2 aplicações, em situações não limitantes (lavouras sem deficiência nutricional, sem interferência de plantas daninhas e insetos, com disponibilidade hídrica e população de plantas adequada), não ocorreu incremento da produtividade das lavouras de soja.  


Esses resultados mostram a importância do controle de doenças nas lavouras de soja no sul do Brasil, visto que, com o aumento da severidade das doenças, ocorre uma redução na área foliar fotossinteticamente ativa e da interceptação de radiação solar (KUMUDINI et al., 2008). Isso tem um impacto ainda maior quando ocorre durante o período de formação de legumes e enchimento de grãos da soja(MONZON et al., 2021) e em cultivares com ciclo precoce (TAGLIAPIETRA et al., 2018). Logo, essa abordagem pode ajudar produtores a entender qual é o retorno potencial que podem atingir ao adotar um maior número de aplicações foliares de fungicidas em lavouras que não apresentem nenhuma outra limitação, ou seja, áreas bem manejadas, irrigadas ou em anos de clima favorável.


As maiores probabilidades de se obter produtividades acima da média das lavouras avaliadas (3056,5 kg/ha) foram observadas quando as lavouras receberam um número maior de aplicação de fungicidas. Para quatro e cinco aplicações de fungicida, a probabilidade de colher mais que a média das lavouras avaliadas foi de 74% e 92%, respectivamente (Figura 2). Para três aplicações, a probabilidade diminuiu para 50%; para duas e uma aplicações foi de 30% e 12%, respectivamente. A probabilidade de colher acima da média das lavouras avaliadas aumentou em 20% a cada aplicação adicional de fungicida.


As probabilidades de obter produtividade acima da média das lavouras está associada com a adoção de maior número de aplicações fungicidas foliares. Como as doenças compreendem um dos fatores que reduz a produtividade das culturas agrícolas, é esperado que o manejo adequado promova a redução da lacuna de produtividade (VAN ITTERSUM & RABBINGE, 1997; VAN ITTERSUM et al., 2013). Neste sentido, considerando a média das produtividades (3056,5 kg/ha) e a probabilidade de se atingir produtividades acima da média, conclui-se que as lavouras que recebem entre quatro e cinco aplicações de fungicidas tem um manejo menos propenso a perdas de produtividade, principalmente quando associado as lavouras com maiores expectativas de produtividade.

¹ Departamento de Fitotecnia, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria/RS.

² Crops Team – Consultoria, Pesquisa e Desenvolvimento, Santa Maria/RS.

³ Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Campus Santa Helena Santa Helena/PR

Referências

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DALLA LANA, Felipe et al. Meta-Analytic Modeling of the Decline in Performance of Fungicides for Managing Soybean Rust after a Decade of Use in Brazil. Plant Disease, [s. l.], v. 102, n. 4, p. 807–817, 2018.

DI MAURO, Guido et al.Environmental and management variables explain soybean yield gap variability in Central Argentina. European Journal of Agronomy, [s. l.], v. 99, p. 186–194, 2018. Disponível em: Acesso em: 15 ago. 2023.

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