Integração lavoura-pecuária-floresta: intensificação sustentável para a sobrevivência humana


Autores: Renato Serena Fontaneli , Roberto Serena Fontaneli , Henrique Pereira dos Santos , Alfredo do Nascimento Junior, Ricardo Lima de Castro , Eduardo Caierão , Cleiton Korcelski , Angelica Consoladora Andrade Manfron , Francine Talia Panisson , Manuele Zeni , Arthur Pegoraro Klein , Diógenes Cecchin Silveira , Renata Rebeschini , Emanuel Cassol Dall’Agnol , Igor Kruel Bortolotto, Lucas Biasus do Santos , Kétlin Rodigheiro
Publicado em: 31/08/2019

1 Introdução

O crescente aumento populacional do planeta que segundo projeção da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), atingirá 10,7 bilhões de pessoas em 2050 e a maior demanda quantitativa e qualitativa de alimentos, fibra, madeira, energia e outros bens que dependerão cada vez mais de agricultores e profissionais das Ciências Agrárias, altamente capacitados. O Brasil já produz alimentos para uma população de cerca de 1,2 bilhão de pessoas e tem recursos para a produção de mais 30 a 40% dos produtos demandados pelo aumento populacional projetado pela FAO. Restando três décadas, temos de um lado um grande desafio e, de outro, uma grande oportunidade.

Atualmente ocupamos 30% da superfície do País com atividade agrossilvipastoril (60 milhões de hectares de culturas, especialmente produtora de grãos e 170 milhões de hectares de pastagens), em todas as regiões brasileiras. Entende-se sustentabilidade, no contexto de desenvolvimento, como o sistema que supre as necessidades atuais, sem comprometer o atendimento das necessidades das futuras gerações. As atividades humanas devem ser desenvolvidas em harmonia com o sistema natural por um tempo indeterminado, incorporando as dimensões econômica, social e ambiental.

Sem dúvida, os sistemas de integração lavoura-pecuáriafloresta (ILPF) podem atender essa premissa. ILPF visa a produção sustentável, integrando estrategicamente atividades agrícolas, pecuárias e florestais realizadas na mesma área, em cultivo consorciado, em sucessão ou rotacionado, e busca efeitos sinérgicos entre os componentes do agroecossistema, contemplando a adequação ambiental, a valorização do homem e a viabilidade do empreendimento (BALBINO et al., 2011). O objetivo desse artigo é apresentar fundamentos dos sistemas ILPF, com ênfase na modalidade de integração lavoura-pecuária (ILP), praticados há décadas na região Sul e, algumas vantagens de sua adoção.

2 Quais os tipos de sistemas integrados empregados no Brasil?

2.1 ILP - Integração lavourapecuária – Agropastoril

Integra os componentes lavoura e pecuária em rotação, consórcio ou sucessão na mesma área em um mesmo ano agrícola ou por múltiplos anos. É o sistema de integração mais praticado nas condições sul-brasileiras. Exemplos: a) soja/bovinocultura; b) arroz irrigado/bovinocultura; c) sistema Santa Fé; d) sistema São Mateus; e) sistema Santa Brígida.

2.2 ILF – Integração lavourafloresta – Silviagrícola ou Agroflorestal

Integra os componentes floresta e lavoura, pela consorciação de espécies arbóreas com cultivos agrícolas (anuais e perenes). O componente lavoura, pode ser utilizado na fase inicial de implantação do componente florestal ou em ciclos durante o desenvolvimento do sistema. Exemplos: a) erva-mate/milho,soja, feijão; b) eucalipto/soja, milho, mandioca; c) plantas perenes em geral (árvores ou arbustos) consorciadas com culturas como milho, soja, feijão, girassol, canola, mandioca, abóbora, pimenta e hortaliças.

2.3 IPF – Integração pecuária-floresta – Silvipastoril

Integra os componentes pecuária e floresta em consórcio. Exemplos: a) Eucalipto/pastagem nativa; b) acácia-negra/ pastagem nativa; c) erva-mate/ pastagens; d) nogueira-pecan/pastagens; e) citros/pastagens.

2.4 ILPF – Integração lavoura-pecuária-floresta ou Agrossilvipastoril

Integra os componentes lavoura, pecuária e floresta, em rotação, consórcio, ou sucessão, na mesma área. Sendo que a lavoura pode ser utilizada na fase inicial de implantação do componente florestal ou em ciclos durante o desenvolvimento do sistema. Exemplos: a) Eucalipto/soja-girassol-pastagem; b) Nogueira-pecan/ lavoura-pastagem; c) Erva-mate/ lavoura-pastagem; d) Citros/lavoura-pastagens.

3 ILPF em números no Brasil

Em levantamento realizado no Brasil na safra 2015/2016, os sistemas integrados de produção agropecuária ocupavam uma área de 11,5 milhões de hectares. Sendo o estado do Mato Grosso do Sul (MS), líder com 2,0 milhões, seguido de Mato Grosso (MT) e Rio Grande do Sul (RS) com 1,5 milhão de hectares e Minas Gerais (MG) com 1,05 milhão de hectares. Entretanto, em termos percentuais, o RS com 20,5% foi o estado com maior participação percentual do sistema ILPF em relação à área total de agropecuária, seguido de Santa Catarina (SC) com 19,3%. MS, MG e MT, ocupavam 10,7%, 5,5% e 4,8%, respectivamente, da área com atividade agropecuária com sistemas ILPF (Tabela 1).

A região Sul-brasileira englobando parte do bioma Mata Atlântica e o total do bioma Pampa, ocupa uma área de aproximadamente, meio milhão de km2, de um total de 8,5 milhões de km2 do Brasil. O clima predominante é subtropical, com temperaturas médias inferiores a 18oC, estações bem definidas, com precipitação pluvial anual bem distribuída, de 1.250 a 1.900 mm. Nessa região está grande parte do aquífero Guarani, uma das maiores reservas de água doce do Planeta. Dentre as diferentes configurações dos sistemas ILPF, a ILP ocupa 83% das áreas com integração no RS e 75% em SC, seguido da modalidade mais complexa, a ILPF com 14% em ambos os estados sulinos.

4 Adoção dos sistemas ILPF no Rio Grande do Sul, segundo levantamento 2015/2016 (ILPF, 2016)

Os principais motivos para os pecuaristas gaúchos adotarem os sistemas ILPF são: 1º Redução do impacto ambiental, 2º Aumento da rentabilidade por área e 3º Rotação de culturas por necessidade técnica. Os principais motivos para os agricultores gaúchos adotarem sistemas ILPF são: 1º Aumento da rentabilidade por área, 2º Diminuição do risco financeiro com a diversificação de culturas e 3º Rotação de culturas por necessidade técnica.

5 Vantagens e benefícios dos sistemas integrados

"A lavoura e a pecuária são inseparáveis" (Joaquim Francisco de Assis Brasil)

5.1 Por que o agricultor deve integrar produção de grãos com a pecuária?

• Produz palha para o sistema plantio direto,
• Reduz a população de plantas daninhas,
• Aumenta a eficiência de uso de Ca e Mg,
• Melhora a reciclagem de nutrientes e ativação da biota do solo,
• Melhora a dinâmica do N,
• Aumenta da matéria orgânica no solo em quantidade e qualidade,
• Aumenta a produtividade total, a margem bruta e diminui o risco,
• Aumenta a sustentabilidade.

5.2 Por que o pecuarista deve integrar sua atividade com a produção de grãos?

• Produz forragem de melhor valor nutritivo,
• Aproveita resíduos da lavoura para alimentação animal,
• Recupera a produtividade da pastagem,
• Aumenta biomassa radicular,
• Aumenta a atividade microbiana,
• Aumenta a correção de acidez em profundidade,
• Aumenta a ciclagem de N e K,
• Aumenta o estoque de C e N,
• Aumenta a taxa de sequestro de C,
• Diminui custo de implantação de pastagens,
• Aumenta a ressemeadura natural de azevém e leguminosas,
• Aumenta produção e produtividade animal,
• Aumenta a produtividade total, a margem bruta e diminui o risco,
• Aumenta a sustentabilidade.

6 Estratégias básicas para adoção de sistemas ILP, considerando as espécies de forrageiras componentes de pastagens, segundo Fontaneli et al. (2012)

6.1 Sistema ILP baseado em pastagens anuais de inverno

Considerando a área cultivada pelas principais culturas de sequeiro de verão, na safra 2018/19 no RS, em hectares foram, 5,7 milhões de soja, 0,73 milhão de milho para grão (Tabela 2) e 0,35 milhão de milho para silagem. O arroz irrigado é cultivado em cerca de 1,1 milhão de hectares, concentrados no bioma Pampa, na metade do sul do estado. Por outro lado, em 2018 no inverno foram cultivados, em mil hectares, 682 de trigo, 266 de aveia-branca, 56 de cevada, 35 de canola e 5,7 de triticale e 1,5 de centeio (Tabela 2). Assim, apenas 15% a 17% da área produtora de grãos no verão foram utilizados com cereais de inverno e canola. Estima-se uma relação aproximada de 6:1 entre as culturas de sequeiro de verão e as de inverno ou 7:1 quando o arroz irrigado é incluído.

Observa-se que essas áreas possuem elevada potencialidade de serem cultivadas no inverno, pois a maior parte é subutilizada, permanecendo em pousio nesse período. Outra parte é usada empiricamente com pastagens anuais (aveia e azevém) e, também com culturas de cobertura de solo. O mercado oferta “mixes” ou misturas comerciais de aveiapreta, centeio, nabo, ervilhaca e ervilha-forrageira, em proporções desconhecidas por produtores e técnicos. Alternativa positiva pelo fato de contribuir com a proteção do maior patrimônio dos agricultores, o solo.

Quais culturas podem ser intensificadas no inverno?

O cultivo de cereais de inverno (trigo/cevada) sofrem forte competição com os Países do Mercosul, especialmente Argentina, a qual é mais eficiente. Nessa conjuntura a bovinocultura de corte e de leite surge como oportunidade de utilização dos recursos terra, mão de obra, máquinas e equipamentos para produção de alimentos de elevado valor nutritivo, desde forragem para pastejo ou colhidas e conservadas como silagem (pré-secado, planta inteira e grãos úmidos) e como feno, que poderiam suprir as demandas nutricionais de cerca de 1,4 milhão de vacas leiteiras no RS e de cerca de 4,0 milhões de vacas leiteiras na região Sul, com a baixa média diária de 10,5 litros de leite por vaca. Em um cenário hipotético onde metade da dieta de 4,0 milhões de vacas seja a base de pasto de aveia-azevém e/ou trigo de duplo-propósito, 25% de silagem e o restante 25% de grãos, ambos de cereais de inverno, considerando um período de lactação (305 dias), e um animal com peso médio de 500 kg e consumo de 4,0% peso vivo (PV) em massa seca (MS), resultando em 20 kg de MS/vaca por dia.

Ao se calcularar as exigências nutricionais estimando 10,0 kg MS de pasto, 5,0 kg de MS de silagem e 5,0 kg de grãos, pode-se inferir que uma vaca consome o equivalente a 0,5 ha de pastagem de inverno, 0,25 ha de silagem e 0,5 ha de grãos de cereais de inverno, resultando em 5,0 milhões de hectares na região Sul (com produtividade média de 6,0 t MS/ha, na forma de pasto ou silagem e 3,0 t/ha de grãos de trigo, aveia-branca, cevada, triticale ou centeio). Se considerarmos apenas o rebanho do RS, significa a utilização de 1,75 milhão de hectares para atender o rebanho leiteiro em produção. Pode-se com isso, esperar a produtividade de 15 a 20 kg de leite, acréscimo suficiente para aumentar a produtividade de leite em 60 a 90%, na região considerada (RS, SC e sul do PR).

Projeção semelhante pode ser realizada para a bovinocultura de corte do RS, se estimarmos que 20 a 30% do rebanho bovino de 13,5 milhões de animais, poderiam ser engordadas anualmente em pastagens de inverno, com um consumo médio diário de 10, 0 kg MS por animal, resulta em 1,0 a 1,5 milhão de hectares de pastagens, pastejadas durante 3 a 4 meses (maio/junho a setembro/outubro). Se 50% do acúmulo de fitomassa de 6,0 a 7,0 t MS/ha e estimando uma massa residual de 3,0 a 3,5 toneladas de MS residual (palhada), fundamental para a sustentabilidade do sistema plantio direto.

Mas quanto resultará em ganho de peso?

Estimando um ganho médio diário de 1,0 kg por bovino durante 100 a 120 dias de pastejo, resulta em 100 a 120 kg de ganho de peso vivo por animal, multiplicado pela lotação média de 3,0 animais por hectare será igual a produtividade de 300 a 360 kg por hectare. Se atribuirmos valor de mercado de R$ 5,00 por quilograma de bovino vivo bem acabado, aumentaria a renda bruta de 1.500 a 1.800 reais por hectare. Resultado de um consumo de 3,0 a 3,6 t MS/ ha, sem afetar a produtividade da soja (MARTINS et al., 2015). Será que atividade é atrativa e alternativa ao pousio.

Esse raciocínio, da oportunidade de realizar mais no inverno, sem prejudicar as atividades de verão, pode ser para muito mais produtores do que o número atual. Desafio que a cada ano muitos tem experimentado e observa-se mais aumento de escala do que desistências. Por enquanto, descrevemos como alternativa ou oportunidade, mas em breve, serão necessários para a sustentabilidade. Atribuindo valores a produção de leite diária de 20 kg de leite/ vaca, durante 305 dias, resulta em 6.100 kg de leite/vaca, com utilização de 1,25 hectares por cada vaca, ou seja produtividade de 4.880 kg/ ha de leite.

Se atribuirmos um valor médio de um real por litro de leite, embora com maior variação temporal de preço que a carne, resultam cerca de R$ 5.000,00 (cinco mil reais por hectare), aproximadamente três vezes superior a engorda de bovinos, valor também considerado atualmente para a cria de bovinos em terras da região norte do estado, as mais valoradas. “Esses números tem a confiabilidade por estarem embasados em centenas de trabalhos científicos, de validações de técnicos e de produtores que ajudam a divulgarem com convicção em seus depoimentos em reuniões diversas, dias de campo e outros treinamentos”.

6.2 Sistema ILP baseado em pastagens anuais de estação quente

Dos sistemas considerados este é o que apresenta menor expressão, apesar disso há grande potencial para utilização deste, através do uso de espécies alternativas para a rotação de culturas nas áreas cultivadas com soja, cada vez mais suscetível a novos patógenos. A rotação de culturas é um dos pilares do sistema plantio direto e, o milho, por inúmeras razões tem sido negligenciado, pois se analisarmos as estimativas de cultivo de soja e de milho, teremos a razão de 6:1, enquanto cultiva 6,0 milhões de hectares de soja e 0,65 milhão de ha de milho grão e 0,35 milhão de ha de milho para silagem.

Estima-se, baseado nas áreas inscritas para produção de sementes de sorgo para alimentação animal, que no máximo será cultivado de 0,4 a 0,5 milhão de ha de sorgo (Sorghum spp.) e de milheto (Pennisetum americanum). Registra-se uma área incerta de capim-sudão, ou aveia-de-verão, variedade de sorgo para pastejo mais popular em áreas onde a semente é colhida e armazenada pelos agricultores, especialmente em pequenas propriedades.

A cultivar BRS Estribo é a primeira cultivar de capim-sudão registrado no MAPA, enquanto o teosinto (Zea mays var. mexicana) também cultivado, mas em escala bem menor expressão que o capim-sudão, sorgos híbridos e milheto ou capim-italiano. Em termos de potencial de produção animal, pode-se atingir de 300 a 700 kg/ha de ganho de peso vivo. Em termos de valor nutritivo, são equivalentes quando bem manejados e fertilizados. Geralmente variedades de sorgo híbrido apresenta maior potencial de produção de fitomassa e compõem pastagens complementares para bovinos.

6.3 Sistema ILP baseado em pastagens perenes de estação quente

As pastagens de gramíneas perenes, geralmente apresentam menor custo em relação às pastagens anuais de verão, sejam elas estabelecidas por sementes ou por mudas. Uma vez estabelecidas podem ser utilizadas por mais de uma década, desde que realizadas as indicações de adubação e bem manejadas, com ajustes de carga animal conforme a oferta de forragem. As pastagens perenes são mais produtivas que as anuais e, principalmente, permitem pastejo antecipado em relação as forrageiras anuais que necessitam de temperatura adequada para o estabelecimento, além de permitirem pastejo moderado no outono, quando geralmente as forrageiras anuais pouco ou nada contribuem.

Na região norte/noroeste do RS, as pastagens perenes permitem pastejo de mais de 7 meses, quando comparados com 3 a 5 meses das anuais. As principais espécies perenes são as gramíneas estabelecidas por via vegetativa, partes de planta (estolões, rizomas, pequenas leivas ou mudas produzidas em viveiros e comercializadas em bandejas com tubetes semelhantes às mudas florestais). As principais cultivares produz das são as do gênero Cynodon e seus híbridos, sendo Tifton 85 e Jiggs as mais cultivadas, para pastejo e fenação, seguidas de capim-elefante para pastejo (BRS Kurumi) e para silagem (BRS Capiaçu).

Mas, mediante encomenda são produzidas, também mudas de grama missioneira-gigante (Axonopus catharinensis), hemártria (Hemarthria altissima) e de capim-quicuio (Pennisetum clandestinum). Por sementes são estabelecidas as espécies capim-colonião (Megathyrsus maximus ex. Panicum maximum), com diversas variedades (Mombaça, BRS Zuri, BRS Tamani, BRS Quênia, Aruana, Áries), grama-forquilha (Paspalum notatum) cultivar Pensacola, braquiárias (Urochloa spp. ex. Brachiaria spp.), especialmente a brizanta (Urochloa brizantha), cultivares BRS Piatã, Marundu, BRS Paiaguás, BRS Ypiporã, Xaraés ou MG 5 Vitória.

Estão em desenvolvimento seleções de capim-papuã (Urochloa plantaginea) que podem resultar em novas cultivares. Em termos de produção animal estimam-se ganhos diários de 0,3 a 0,7 kg/novilho e de até 1.200 kg de ganho de peso/ha. Dentre as leguminosas perenes de verão, registram-se cultivos de alfafa (Medicago sativa) cultivar Crioula, amendoim-forrageiro, estabelecido por sementes (Arachis pintoi) cultivares Belmonte e Amarillo, e amendoim-rizomatoso, estabelecido por mudas/rizomas (Arachis glabrata).

Estas são utilizadas como suplementação para vacas leiteiras de elevado mérito genético em pastejo, terneiras e novilhas ou para fenação, especialmente a alfafa Crioula. Embora sejam comprovadas às melhorias de fertilidade física, química e biológica da rotação de pastagens perenes com produção de grãos, é muito incipiente a rotação de pastagens perenes (3 a 4 anos de utilização) em rotação com cultivos de grãos, atividade desenvolvida na Austrália desde 1880 e no Uruguai, desde os anos 1960, mas no país vizinho tem sido reduzida a importância pelo aumento de cultivo da soja.

6.4 Sistema ILP baseado em pastagens perenes de estação fria

Outra possibilidade de redução de custo de volumosos para produção animal intensiva, como é a leiteira, é o estabelecimento de pastagens compostas por forrageiras perenes, gramíneas e leguminosas. Dentre as gramíneas pode-se destacar a festuca (Festuca arundinacea) e o dáctilo ou capimdos-pomares (Dactylis glomerata). E, entre as leguminosas perenes os trevos, branco (Trifolium repens L.) e vermelho (T. pratense), além do cornichão (Lotus corniculatus). O cornichão, embora de estabelecimento lento é a única leguminosa cultivada em nosso meio que não causa timpanismo.

É importante lembrar que a presença de leguminosas como componente de pastagens, pode resultar em significa redução ou eliminação de adubos nitrogenados. Uma das limitações da utilização de pastagens perenes de inverno é que praticamente, não permitem o cultivo de soja, além de apresentarem potencial produtivo bem inferior às pastagens perenes de verão, cerca da metade do que produz as populares gramasbermuda e seus híbridos, como a Tifton 68, Tifton 85 e Jiggs.

Considerações Finais

A integração lavoura-pecuária (ILP) praticada dentro de certos limites aumenta os rendimentos do produtor na mesma área, principalmente em anos de frustração de safra agrícola. A definição dos limites é feita pelo homem, assim com a definição da intensidade de pastejo para moderada a média, na engorda de bovinos em pastagens anuais de inverno (aveiapreta, azevém, trigo forrageiro) em sucessão a soja, aumenta-se o ganho individual dos novilhos, porém com menor ganho por área.

A medida que a opção é a intensificação pelo aumento de carga animal, com maior ganho animal por área, compromete-se a sustentabilidade do sistema, pelo aumento da densidade do solo, menor infiltração de água, aumento da população de plantas daninhas, diminuição de fitomassa pós-pastejo (resíduo), enfim diminui a qualidade do solo, que é o centralizador de todas as ações de manejo do sistema, ou seja o solo realmente é a “memória” do sistema.

Embora, aumente o ganho animal por área com rendimento de soja similar, o ganho médio diário diminui pela menor oferta de forragem, de menor qualidade, aumenta deslocamento dos animais e o tempo de pastejo e diminui a qualidade de carcaça. Relativo a rotação de pastagens perenes com cultivos anuais, merece registro trabalho conduzido na Embrapa Trigo desde 1993, em que são comparados quatro sistemas de produção ILP com produção de grãos (testemunha).

A testemunha consta de 67% de soja e 33% da área com milho em sucessão a 33% de trigo, 34% de aveia-branca e 33% de ervilhaca. Essa testemunha é contrastada com pastagem anual de inverno (aveia-preta/ervilhaca, pastejada por bovinos de maio a agosto), com 2 a 3 ciclos de pastejo, possibilita a produção de 200 a 400 kg/ha de ganho de peso vivo. Os outros três sistemas ILP, constam rotação de 3 anos de pastagens perenes em rotação com o sistema de produção de grãos (testemunha).

As pastagens são: a) alfafa Crioula, b) Tifton 85 com sobressemeadura outonal de centeio ou aveia-preta (semeada anualmente) consorciada com azevém e leguminosas perenes de inverno, estas semeadas a cada três anos e mantidas por ressemeadura natural (azevém) e, c) festuca com leguminosas perenes (trevos branco e vermelho, e cornichão). Registra-se aumento da qualidade do solo na fase pastagem, constatada pelo aumento das concentrações de carbono orgânico (CO) ao longo do tempo. Entretanto, o CO ou matéria orgânica (MO), indicador de qualidade do solo, decresce na fase de produção de grãos, mesmo com a melhor condução dos princípios do sistema plantio direto. Apesar disso, conclui-se como única maneira de produzir bens para a humanidade de forma sustentável.

No bioma Cerrado, apesar do período de seca, sistemas ILP têm sido aperfeiçoados e têm permitido até quatro safras, segundo colegas da Embrapa Cerrados, Arroz e Feijão, Gado de Corte, Gado de Leite e Milho e Sorgo, que descrevem resumidamente como (safra de soja, safrinha de milho com estabelecimento simultâneo de gramíneas para pastagem, seguido de safra de bovinos e, por último a palhada para o sistema plantio direto) (BUNGENSTAD; ALMEIDA, 2014).

O fato é que sistemas ILP podem gerar elevados rendimentos das culturas e animais, desde que atendidos os fundamentos, imprescindíveis, da rotação de culturas, do sistema plantio direto, mantendo o solo fértil, de genótipos vegetais e animais melhorados e com manejo adequado das pastagens (Balbinot Jr., 2009; Martins el al., 2015; Souza et al., 2018) e, associado à redução de custos de produção (Fontaneli et al., 2000), com menor risco de insucesso econômico ao longo do tempo (Ambrosi et al., 2001), fatores-chave à adoção de sistemas ILP, único caminho, sem volta, de produzirmos bens necessários com sustentabilidade para 10,7 bilhões de humanos com boa qualidade de vida na Terra em 2050.

No sistema ILP há integração no tempo e no espaço da produção animal e produção de grãos por meio da rotação no uso da terra e pode alcançar os maiores benefícios potenciais na rentabilidade. Para finalizar, vale o registro de uma das máximas do Engenheiro Agrônomo Dirceu Gassen: “A rentabilidade é proporcional ao conhecimento aplicado por hectare” (BORGES, 2019).