Tecnologia de aplicação na prática: pontas de pulverização


Autores: Ruy Araujo Pinto Jr.
Publicado em: 31/12/2017

Introdução

Na edição de número 158 da Revista Plantio Direto, fizemos um artigo sobre tecnologia de aplicação denominado “Administrando a deriva para minimizar perdas e melhora resultados”. Na ocasião, procuramos tratar do tema de forma abrangente e genérica. Nesta edição, falaremos do mesmo assunto, porém voltado à escolha de bicos, vazões e pressões para as situações mais específicas. Por mais que tenhamos evoluído em tecnologia de aplicação, o que se observa no campo é que, geralmente, dá-se muita atenção ao produto fitossanitário a ser aplicado, e pouca atenção à técnica de aplicação.

Entretanto, conhecer a forma de aplicação que proporcione melhor cobertura de calda pulverizada e uniformidade de distribuição com gotas adequadas permite que o produto alcance o alvo de forma eficiente e que perdas sejam minimizadas. Muitas vezes o agricultor incorre em despesas adicionais no manejo de pragas, doenças ou mesmo invasoras por estar usando de uma tecnologia de aplicação incorreta.

O funcionamento não satisfatório do seu manejo não aparece em tempo real, e a exigência de uma re-aplicação em um período mais curto de residual só fica evidente após vários dias. Em algumas situações, a perda de eficiência é tão sutil, que nem o produtor, tão pouco o seu técnico, são capazes de identificar ou quantificar o prejuízo gerado por uma aplicação mal feita, isso porque a interação entre fatores climáticos como a seca ou grande quantidade de chuva podem mascarar ou potencializar os erros de aplicação. O controle eficaz de pragas, doenças ou invasoras está vinculado a cinco fatores:

1) Diagnóstico correto: Identificação correta da praga ou doençaalvo da aplicação;
2) Defensivo correto: Sabendo das característica e limitações de cada Ingrediente Ativo quanto a sua sistemicidade, potencial de evaporação, velocidade de ação, entre outros;
3) Seleção do equipamento correto: Bico, cobertura de gotas/ cm², pressão e vazão;
4) Momento da aplicação do produto: Também chamado de “Timing” da aplicação, ou seja, aplicações tardias incorrem em prejuízos que muitas vezes não são mais revertidos, assim como aplicações muito antecipadas podem só gerar despesas adicionais.
5) Certificar-se da qualidade da aplicação: Para isso, é fundamental o uso de papel hidrossensível ou espelho para aferir e quantificar a qualidade da aplicação, e se necessário tomar as medidas necessárias a tempo de serem modificadas as vazões, ou mesmo o bico.

Critérios para escolha de bicos

a) Condições do alvo biológico: Ervas daninhas com maior massa verde, por exemplo, exigem mais de 20 gotas/cm² para herbicida sistêmico, ou 40 gotas/cm² para herbicida de contato. Da mesma forma, fungicidas ou inseticidas para uma soja com mais de um metro de altura, ou com Índice de Área Foliar (IAF) maior que 3. O bom senso é fundamental neste momento de decisão de qual ponta, pressão e vazão usar.

b) Modo de ação do produto: De acordo com o modo de ação e características físico-químicas das moléculas do Ingrediente Ativo, devemos tomar as atitudes coerentes na escolha do bico. Ou seja, para herbicidas com maior potencial de evaporação, devemos engrossar a gota, e cuidar ainda mais os horários de aplicação.

Herbicidas de solo, como as Atrazinas, podem ter o tamanho de gotas aumentado, uma vez que este produto também é redistribuído no solo e absorvido pelas raízes das invasoras. Fungicidas protetores, como os do grupo químico do Mancozebe, devem ter maior cobertura sobre o alvo. Cobertura exigida pelos diferentes categoria produtos do mercado segundo Barthelemy et al. (1990):

b.1) Herbicida Sistêmico = A partir de 20 gotas/cm2. Ex.: Glifosato.

b.2) Herbicida de Contato = A partir de 40 gotas/cm2. Ex. Paraquat.

b.3) Fungicida e Inseticida Sistêmico = A partir de 30 a 50 gotas/cm2. Ex.: Clorantraniliprole, Azoxistrobina.

b.4) Fungicida de Contato = A partir de 70 gotas/cm2. Ex.: Mancozebe.

c) Taxa de aplicação: Este é um item muito polêmico, pois envolve questões técnicas que proporcionam uma melhor ou pior cobertura sobre o alvo biológico, condições do equipamento poder trabalhar nos diversos tipos de terreno, com a barra oscilando o menos possível, e a logística da água para reabastecimento. Menores volumes de aplicação (L/ha) normalmente envolvem tamanhos de gotas menores, e que têm um maior potencial de deriva, exigindo aplicações mais criteriosas e, em alguns casos, à noite, para minimizar estes problemas.

O mais importante ao usar uma vazão fixa para todas as aplicações é trabalhar na plenitude da capacidade do seu bico, atingir o alvo com eficiência, gerando a menor perda possível com uma pressão por volta de 3 bar, que proporciona uma das melhores performances da ponta. É sempre importante ouvir a opinião da Assistência Técnica quanto às melhores taxas de aplicação, até porque devem ser observadas outras características intrínsecas de cada realidade no campo.

d) Condições meteorológicas: É importante que o produtor use mais de uma ponta para fazer o mesmo trabalho, ou seja para herbicidas de contato, ter uma ou mais pontas para trabalhar em situações um pouco mais críticas de vento, temperatura e umidade. Também é possível variar de vazão e pressão, produzindo resultados distintos que podem ser convenientes conforme a situação. Ex.: Em uma aplicação cujo pulverizador avance a 10 km/h, usando um bico TT-110015, a 3 bar de pressão, essas condições produziriam uma vazão de 71 L/ha, com gotas de tamanho médio.

O mesmo bico, a 4 bar de pressão, produziria 82 L/ha, com um padrão de gotas finas. Este é um exemplo de manejo de vazão que produzirá resultados mais ou menos satisfatórios, conforme a situação do alvo ou condições meteorológicas. Em resumo, quando as condições meteorológicas estiverem próximas do limite para aplicação, é importante o produtor trabalhar com gotas um pouco mais grossas, ou variando a pressão com o mesmo bico, trocar de bico ou ainda abortar a aplicação.

d.1) Condições meteorológicas mínimas e máximas para aplicações segundo a Embrapa: Temperaturas = Menores que 30 oC; Umidade = Maiores que 55%; Ventos de até 8 km/h; e) Altura da barra A altura correta de pulverização garante o cruzamento adequado entre os jatos. Geralmente, respeita-se o cruzamento entre jatos na ordem de 30 a 50%, dependendo do modelo utilizado. Em situações extremas, é preferível 100% de sobreposição do que menos de 30%. Neste caso pode haver faixas com sub-dose, ou mesmo falta de Ingrediente Ativo.

Os pulverizadores têm a barra de pulverização suportada por um quadro oscilante, que por sua vez é conectado a um quadro fixo, e que durante a aplicação, o pulverizador transita em solos irregulares com movimentos horizontais e verticais frequentes. Estes movimentos são chamados tecnicamente de oscilações, e influenciam na qualidade da cobertura de calda e ingrediente ativo sobre o alvo durante a aplicação.

Esta oscilação, associada a uma altura de barra muito próxima ao topo das planta e um bico com ângulo muito pequeno, faz com que ocorram faixas de sub-dose na lavoura, ou mesmo faixas sem ingrediente ativo aplicado. Em áreas com declividade mais acentuada ou irregularidade maior no terreno, o recomendado é utilizar menor velocidade, e levantar a barra a uma altura um pouco acima da recomendação do fabricante do bico. J. Connor Ferguson (2017) demonstrou que as diferenças de padrão de gotas podem ocorrer quando diferentes misturas de tanques são usadas, particularmente quando comparadas com as publicadas nas tabelas de bicos do fabricante, que normalmente são baseadas em pulverização apenas de água.

Os aspectos relacionados com a qualidade do espectro gerado, a dinâmica das gotas no trajeto entre a ponta e o alvo, o risco de deriva, a penetração das gotas no dossel das plantas e a deposição destas gotas sobre as folhas poderão ser alteradas toda a vez que a calda for modificada. Ou seja, as diferentes formulações, e mesmo diferentes adjuvantes, podem modificar a física da gota, em especial, a viscosidade, o que pode alterar a faixa de deposição.

Em um sistema de atomização (aplicação) convencional, o aumento da pressão aumenta o ângulo de pulverização, e o seu inverso também é verdadeiro, e comum de ocorrer quando se altera a velocidade na aplicação por ultrapassar um obstáculo na lavoura, como por exemplo uma valeta ou ao se manobrar em uma cabeceira. A redução da pressão, abaixo da capacidade do bico, pode provocar falhas graves na aplicação, conforme apresentado na Figura 4.

Depois de avaliar os prós e contras de todos os fatores listados, o produtor já pode “ir às compras” e adquirir um, ou mais jogos de bicos novos, sempre lembrando que os bicos com ângulo maior permitem trabalhar com a barra mais baixa, e isso reduz o potencial de deriva, bem como permite maior uniformidade de aplicação em terrenos de topografia menos favorável. Hoje no mercado existem bicos leque, não apenas com 110º de ângulo, mas se encontram também bicos com 120º a 135º. Sempre lembrando que, quando se aumenta a pressão do bico, o seu ângulo pode ficar maior do que o recomendado nas tabelas do fabricante, bem como, quando se diminui a pressão, o seu ângulo pode diminuir a ponto de não sobrepor a pulverização do lado, e isso pode gerar falhas na aplicação.

Em aplicações de fungicidas e inseticidas é recomendado o uso de bicos de jato cônico vazio, especialmente em culturas com grande massa foliar, em que a penetração das gotas no dossel e a cobertura do alvo são essenciais (Srivastava et al., 1993; Wilkinson et al., 1999). Herbicidas de contato, ou plantas que tenham muita massa verde exigem bicos que produzam boas coberturas com baixo potencial de deriva.

Nestas situações, os bicos duplo leque podem trabalhar bem, gerando a cobertura desejada com uma gota de diâmetro médio. Já os herbicidas de solo podem ter as gotas engrossadas uma vez que, normalmente combinam um modo de ação sistêmica pela folha também com a absorção radicular. Observe a foto abaixo de uma aplicação errada, com gotas muito finas, usada na Inglaterra com aplicação de herbicida pré-emergente (Figura 5).

f) Conferir a qualidade da aplicação: Deveria ser prática comum o uso do papel hidrossensível de tempos em tempos, para que o operador tivesse a real noção da eficiência da sua aplicação. Em especial, quando as condições de aplicação não forem as melhores ou quando houver muita massa de folhas cobrindo o alvo biológico. Na falta deste, o produtor pode improvisar utilizando um espelho. O importante é que se tenha o hábito de avaliar, medir, comparar e, se necessário, tomar as providências necessárias para melhorar a qualidade da aplicação.

g) Momento de trocar os bicos: Há muita polêmica em relação ao momento de troca dos bicos. Falase em número de horas de uso, mas isso, em minha opinião, é um mero indicativo que serve para comparar os diferentes materiais. A vida útil de um bico é diretamente influenciada pela pressão de trabalho e tipo de formulação que é mais trabalhada. Por exemplo, as formulações em pó são muito mais abrasivas que as líquidas. Também deve-se levar em consideração a arquitetura do bico, ou seja, algumas pontas são de formato arredondado, o que reduz o atrito e a abrasão. A troca do bico deve ocorrer quando ultrapassar em 10% da vazão recomendada pelo fabricante em uma determinada pressão de trabalho, ou seja, se a ponta se mantiver abaixo deste limite, é porque ele mantém as suas características desejáveis.

Considerações finais

Finalizamos com três dicas para reduzir a deriva, segundo Jason Deveau (Especialista em Tecnologia de Aplicação em Ontario, no Canadá): A primeira dica é manter a barra de pulverização o mais baixo possível. A dica número dois é buscar um maior tamanho de gota, considerando a cobertura necessária para se ter efeito. E por último: Se estiver ventando acima de 10 km/h, não tem sentido pulverizar: “Você só vai causar deriva e a cobertura vai sofrer”. Arrasto aerodinâmico determina a rapidez com que as gotas vão cair para a terra. Pequenas gotas têm maior arrasto e cairão lentamente; gotas maiores têm menor arrasto e cair mais rapidamente. Pela mesma razão, o vento influencia o caminho de pequenas gotículas mais do que grandes gotas, de modo que pequenas gotículas são depositadas mais distante (ou evaporam mais cedo) que as grandes gotas, ou seja, são mais sujeitas as condições meteorológicas negativas com vento, temperatura e umidade.

Referências

CUNHA et. al. Espectro de gotas de bicos de pulverização hidráulicos de jato plano e de jato cônico vazio. Pesq. Agropec. Bras., Brasília, v.39, n.10, p.977-985, out. 2004.

DEVEAU, J. Sprayer math for banded applications. Disponível em: DEVEAU, J. Three tips for managing spray drift. Disponível em: DEVEAU, J. Basic Sprayer Education for Applying Organic Products. Palestra realizada em Simcoe, Ontario, Canada. 2014.

FERGUSON, J. C. GroundCover Supplement Issue: Nozzle outputs respond to nozzle design and tank mix. University of Queensland. 2017. Disponível em: JACTO Máquinas Agrícolas S/A. Programa de treinamento em tecnologia de aplicação de agrotóxicos. Módulo II. Dispositivos geradores de gotas. 2009.

JACTO Máquinas Agrícolas S/A. Folhetos promocionais de bicos de pulverização. 2014. SRIVASTAVA, A.K.; GOERING, C.E. ROHRBACH, R.P. Chemical Application. In: —. Engineering principles of agricultural machines. St. Joseph: ASAE, 1993. p.265-324.

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