Ocorrência de capim-arroz resistente ao glifosato em áreas de produção de soja no RS


Autores: Sylvio Henrique Bidel Dornelles; Danie Martini Sanchotene; Andrei Beck Goergen; Matheus Bohrer Scherer
Publicado em: 30/04/2017

As gramíneas, no contexto atual do manejo de plantas daninhas em lavouras comerciais, representam um grande desafio a ser vencido. Na cultura do arroz, em função do principal sistema utilizado ser basicamente atendido por herbicidas inibidores da enzima ALS (como as imidazolinonas, por exemplo) - que são potencialmente latifolicidas (controle de plantas de folha larga) -, mas com algum efeito sobre algumas gramíneas (folhas estreitas), o problema, em número de espécies ocorrentes, é maior do que na cultura da soja, onde ainda se utilizam em larga escala herbicidas com eficiência graminicida que permitem um controle mais amplo e eficiente. Entre as gramíneas da cultura do arroz, destaca-se o capim arroz (complexo de plantas do gênero Echinochloa).

As diferentes espécies de capim arroz vegetam em ambientes variados, desde os campos alagados das várzeas arrozeiras até as terras altas bem drenadas. São plantas rústicas, de ampla adaptabilidade a distintos locais e condições. Entretanto, danos a culturas comerciais por estas espécies têm sido relatados para a cultura do arroz, em que é uma das espécies que têm apresentado resistência a herbicidas de diferentes mecanismos de ação.

Nos últimos cinco anos, em levantamentos realizados pelo Grupo Interdisciplinar de Pesquisa e Herbologia do setor de Botânica – Departamento de Biologia da Universidade Federal de Santa Maria, o capim arroz foi encontrado como infestante em áreas produtoras de soja nos municípios de Santa Maria, Tupanciretã, Júlio de Castilhos, Cruz Alta, Augusto Pestana, Cachoeira do Sul, Dom Pedrito, Rosário do Sul, São Sepé, São Borja e São Gabriel.

Os estudos revelam que não ocorre uma população padrão de uma determinada espécie de capim arroz que esteja bem adaptada a todos os ambientes de terras altas bem drenadas, ocorrendo pelo menos três espécies (entre estas populações nos diferentes locais onde têm sido encontradas): Echinochloa crusgalli var. crusgalli (capim arroz, canevão, jaú, crista de galo), Echinochloa colona (coloninho) e uma espécie de introdução mais recente no Rio Grande do Sul, a Echinochloa crusgalli var. oryzoides (capim arroz do lombo branco).

Os produtores de soja, preocupados, têm dito: “o capim arroz está subindo a coxilha!”, em referência ao entendimento de que se trata de uma planta de terras baixas alagadas que, atualmente, está ocorrendo também no planalto em lavouras de soja e em áreas não suscetíveis ao alagamento. Mas isto é um engano! Ao viajarmos por diferentes regiões produtoras de soja do RS - desde a Zona Sul com as terras baixas alagadiças até o planalto com as terras altas drenadas -, encontramos estas espécies de capim arroz vegetando normalmente em beiras de estradas e em ambientes não alagados, o que nos revela que se tratam de espécies com adaptação a terrenos onde não há encharcamento do solo.

Os estudos iniciais realizados na UFSM com plantas coletadas nestes locais de produção de soja permitiram verificar que parte destes biótipos de capim arroz apresentam níveis variados de suscetibilidade ao herbicida glifosato, ocorrendo parcela de biótipos com resistência ao herbicida - alguns com baixo nível de resistência e outros com alto nível de resistência (fator de resistência maior que 10). Espécies de capim arroz resistentes ao glifosato também têm sido relatadas em encontros técnicos com pesquisadores da Argentina, do Uruguai, da Austrália e dos Estados Unidos, entre outros países produtores.

Nas áreas onde foram realizadas as coletas e os estudos alternativos com o capim arroz, o manejo com aplicações de glifosato foi combinado dentro de programas que incluem herbicidas graminicidas, como o cletodim, permitindo controlar as gramíneas mesmo em escapes, quando as plantas já estavam em estágio avança do de desenvolvimento e no início da emissão das inflorescências.

Há áreas onde o nível populacional já é preocupante e que vai ser necessário usar herbicidas pré-emergentes para segurar o banco de sementes, facilitando a complementação de controle com herbicidas pós-emergentes específicos. O certo é que o capim arroz também deve entrar no rol das preocupações com gramíneas que podem infestar áreas de produção de soja, não só nas áreas de rotação soja-arroz, como também nas principais regiões produtoras em terras altas, podendo apresentar dificuldades no controle com o herbicida glifosato.

Deve-se alertar para casos onde pequenas infestações vêm ocorrendo e que ainda não foram motivo de reclamação dos produtores, mas que, tal qual outras gramíneas como o capim amargoso (Digitaria insularis) ou capim pé-degalinha (Eleusine indica), começam a aparecer com maior frequência nestas áreas, especialmente no planalto e depressão central. Para evitar a introdução e naturalização destas espécies dentro do ambiente de produção de soja, é preciso atenção para prevenir a reprodução e a disseminação da planta daninha no banco de sementes, o que resultaria em mais problemas à produção da nossa principal oleaginosa.

Neste contexto, a limpeza de máquinas colheitadeiras que são usadas em diferentes locais onde esta planta daninha comumente ocorre, o uso de sementes de excelente qualidade tanto de soja como de forrageiras semeadas no inverno e o manejo adequado com quarentena de rebanhos bovinos rotacionados dentro do sistema integrado, exigem cuidados para que se evite a introdução destas espécies.

Estes têm sido, pelos levantamentos preliminares, os principais meios de disseminação destas espécies de capim arroz nas áreas estudadas. O uso de programas de manejo incluindo herbicidas pós-emergentes eficientes para o controle das espécies será necessário, especialmente o cletodim, que mostrou eficiência superior aos demais nos estudos realizados. Para a recomendação adequada de manejo, consulte um engenheiro agrônomo.