Em debate a fertilidade do solo e a nutrição de plantas em Sistema Plantio Direto


Autores: Equipe Editorial Revista Plantio Direto
Publicado em: 30/04/2017

Com o objetivo de debater a fertilidade do solo e a nutrição de plantas em Sistema Plantio Direto a Revista Plantio Direto & Tecnologia Agrícola, Plantec A.P. e Agromac/Fertisystem realizaram em Passo Fundo, no dia 11 de Abril, o Encontro Técnico: Fertilidade do Solo e Nutrição de Plantas. O evento recebeu mais de 600 participantes e contou com o apoio da Agro+ e o patrocínio da Fundação Agrisus, Calcário Foscarini e Yara Fertilizantes.

Pela amplitude e importância do conteúdo apresentado, pela riqueza das discussões, além das características do público participante, que foi formado por agricultores líderes e técnicos que são referência em suas regiões, o Encontro Técnico atingiu plenamente os objetivos de discutir a fertilidade do solo e a adubação dos sistemas de produção sob plantio direto.

A fertilidade do solo na perspectiva da planta

Na abertura do evento o engenheiro agrônomo Dirceu Gassen fez uma palestra de provocação que tratou da fertilidade do solo na perspectiva da planta. Iniciando sua fala Gassen lançou o questionamento de como os agricultores estão preparando o “prato” para alimentação da planta, de forma que ela consiga se nutrir adequadamente.

Ele comparou “o ciclo da pobreza”, que inclui a queima da palha, a gradagem e escarificação e consequente erosão, e o “ciclo virtuoso” na fertilidade do solo, que inclui como elementos a palha, as raízes, a rotação de cultura e a atividade biológica, que de seu ponto de vista, são essenciais para a alta fertilidade de um solo. Um dos pontos levantados pelo agrônomo foi a necessidade da cobertura permanente do solo pela palha e pelas plantas, exemplificando os possíveis problemas que ocorrem quando essa cobertura não é bem feita, além da necessidade de se obter um sistema radicial robusto para a melhoria das condições do solo.

Ele criticou a qualidade do plantio direto que tem sido feito. Segundo ele, o plantio direto está se tornando na realidade um “plantio sem lavrar”, sem focar de verdade no sistema como um todo. Foram mostradas algumas espécies de diferentes famílias possíveis de serem utilizadas no período em que não se cultiva a cultura principal (outono/inverno).

Para Dirceu, a adubação verde não se torna custosa, considerando que ela é fundamental para maior produtividade das culturas de maior interesse econômico. Ainda segundo Gassen, se a planta “falasse” de suas demandas, ela diria que o problema está na distribuição dos insumos necessários no solo (fertilizantes e corretivos) e especialmente problemas na estruturação do solo, que não permitem a planta absorver água e nutrientes de forma adequada.

Outros tópicos comentados pelo agrônomo foram: A relação da densidade de raízes e a absorção de determinados nutrientes e água; a questão da produção de biomassa, na forma de grãos, palha e adubação verde em diferentes esquemas de rotação de culturas; a infiltração de água no solo e o problema da compactação causado pelo tráfego de máquinas, e a importância da palha na resistência do solo à desestruturação pela chuva.

Dirceu finalizou comentando que para ele os dois principais crimes de outono são deixar a área em pousio, multiplicando plantas daninhas, e semeadura a lanço, realizando gradagem após isso.

Agricultura de Precisão: caminhos para melhorar a qualidade do sistema plantio direto e buscar altas produtividades

A segunda palestra do evento foi ministrada pelo Dr. Antonio Luís Santi, da Universidade Federal de Santa Maria (campus Frederico Westphalen) intitulada “Agricultura de Precisão: Caminhos para melhorar a qualidade do sistema plantio direto e buscar altas produtividades”.

O professor iniciou sua fala comentando sobre a ideia errônea que muitos têm tido a respeito da agricultura de precisão, de que as altas produtividades são fruto de mapas e tecnologia embarcada nas máquinas, e que essa tecnologia é a resposta para todos os problemas da agricultura. Falando a respeito dos pioneiros do Plantio Direto no Brasil, o Dr. Santi destacou uma fala do Dr. Fernando Penteado Cardoso, da Fundação Agrisus: “gostaria que para cada quilo de adubo aplicado na lavoura, houvesse um copo de água disponível no solo”.

Com esse destaque, o professor mostrou dados de um experimento a respeito da infiltração da água e escoamento superficial em zonas de alta produtividade e de baixa produtividade em área de lavoura, onde foi simulado nos dois solos uma precipitação de 300mm. Como resultado, o solo da zona de alta produtividade resistiu a precipitação intensa sem desestruturar durante 27 minutos, enquanto que um de baixa produtividade resistiu por menos de metade do tempo (11 minutos).

Santi mostrou dados de áreas de lavoura de algumas regiões por meio de mapas de produtividade, comentando sobre a grande variação que ocorre nas lavouras do estado. Existe, segundo ele, em praticamente todas as propriedades do Estado do Rio Grande do Sul zonas de baixa produtividade, colhendo quantidade de grãos abaixo da média, zonas de média produtividade, colhendo produtividades normais para a região, e zonas de alta produtividade, que atingem níveis mais elevados do que os normais de produção.

O objetivo, segundo o professor, é diminuir a variação dentro das lavouras, identificando as zonas de baixa produtividade e quais os fatores que determinam essa situação, para assim poder corrigi-los ao longo do tempo. É necessário que haja um dimensionamento correto da amostragem, para que os dados obtidos tenham veracidade.

Santi indagou que a amostragem feita de forma precisa fornece dados com maior precisão, e dessa forma nos permite atuar de forma eficaz onde realmente está o problema nas zonas de baixa produtividade.

Outro ponto abordado pelo pesquisador foi a questão dos erros de manejo, que segundo ele, não podem ser corrigidos por nenhuma tecnologia. A erosão decorrente de Plantio Direto de baixa qualidade acarreta em reduções consideráveis de produtividade, além de causar danos ambientais. Mostrou-se por meio de mapas temáticos que a diversidade biológica tem alta correlação com a produtividade das culturas.

Isso se deve ao fato de a atividade biológica ser influenciada pela qualidade do solo, assim como também auxilia na construção de zonas de alta produtividade, promovendo aumento do teor de matéria orgânica, maior infiltração de água, entre outros fatores.

O desafio, segundo o professor, é aumentar o teor de matéria orgânica no perfil.

O pesquisador afirmou que durante o ano, não inserir nenhuma espécie no outono/inverno é uma prática que deve ser desconsiderada. Segundo ele, é necessário aproveitar os momentos em que não está se cultivando a cultura de principal interesse para alimentar o sistema com a produção de biomassa.

Por fim, Santi mostrou também mapas de lucratividade da área experimental na safra 2010/2011 de soja, onde nas áreas de maior qualidade do solo e atividade biológica, o lucro foi maior, compensando o lucro menor nas zonas de menor qualidade do solo, exemplificando que o custo para melhorar a qualidade do solo acaba sendo interessante do ponto de vista econômico, também.

A biologia do solo como fator de melhoria da fertilidade em plantio direto

A última palestra da parte da manhã foi conduzida pelo Dr. Ademir de Oliveira Ferreira, da Universidade Estadual de Ponta Grossa. O professor começou sua fala com alguns abordando conceitos a respeito da matéria orgânica do solo, explicando sobre os compartimentos da matéria orgânica, sendo eles o reservatório ativo, formado pelos organismos vivos do solo e pela matéria orgânica prontamente decomponível (raízes, serapilheira, rizodepósitos), e o reservatório estável, formado pelas substâncias húmicas e não húmicas, também comentando sobre a composição de cada uma dessas partes.

O pesquisador também tratou dos atributos químicos, físicos e biológicos do solo que são influenciados pelo carbono orgânico, como pH, CTC, densidade, agregação, porosidade, mineralização, entre outros. Foram citados também alguns fatores que influenciam na diversidade da biomassa, como a temperatura intermediária do solo, pH do solo, pastagem permanente e diversidade de cultivos, retorno de resíduos, boa drenagem e boa aeração.

Entre as ideias e conceitos apresentados para introduzir os estudos feitos nas áreas sob sistema plantio direto, estiveram a rizosfera e sua maior concentração de diversidade de organismos e substâncias; a composição da biomassa microbiana do solo (cerca de 50% são fungos); a velocidade de decomposição das substâncias liberadas pelos organismos no solo e também a dinâmica do carbono e do nitrogênio nos resíduos culturais e no solo.

Ferreira apresentou a questão dos macroagregados, que são agregados presentes em solos com tamanho considerável, formados por raízes, hifas de fungos e polissacarídeos e que protegem o carbono orgânico do solo. Ademir falou sobre a formação desses macroagregados em solos sob sistema de plantio direto, e seu uso como indicativo da qualidade do solo.

Também demonstrou através de dados de pesquisa o efeito de algumas espécies na qualidade do solo, medida pelo comprimento de raízes por volume de solo, carbono orgânico e estabilidade dos agregados. Como estudo de caso, ele falou do campeão nacional de produtividade de soja, Alisson Hilgenberg, com 141 sc/ha de soja.

Analisando a atividade biológica por meio da respiração basal, foi demonstrado que a atividade biológica da área campeã era similar a atividade em áreas nunca cultivadas. O produtor seguiu durante 27 anos com a seguinte sequência de rotação de culturas: feijão, milho, soja, soja, feijão, milho, soja, soja, feijão, milho, soja, soja, com aveia preta ou trigo na segunda safra, e correção de calcário a cada 2 anos.

O professor citou experimentos realizados em áreas pioneiras do plantio direto no estado do Rio Grande do Sul, e, além disso, comentou também sobre o manejo da altura da pastagem em sistemas integrados, e sua influência na matéria orgânica do solo. Durante a palestra Ferreira trouxe informações a respeito do tempo de duração do sistema de plantio direto, dividido em fases, onde a fase inicial, nos primeiros 5 anos de adoção do sistema, ocorre maior imobilização de nutrientes do que mineralização.

Dos 5 primeiros anos até os 10 anos da adoção do sistema, ocorre o período de transição onde a imobilização é maior ou igual a mineralização. Dos 10 aos 20 anos, ocorre a consolidação do sistema, onde ocorrem todas as situações (imobilização maior, igual ou menor do que a mineralização) e cada vez mais a mineralização é maior do que a imobilização.

Na fase final, ou de manutenção, a mineralização é maior do que a imobilização de nutrientes, e há aumento da qualidade do solo. Por fim, ele concluiu que o reestabelecimento dos ciclos biológicos está diretamente relacionado com a manutenção do solo permanentemente coberto com resíduos culturais ou plantas vivas para promover um fluxo contínuo de C e N através da comunidade microbiana. A parte da manhã foi encerrada com perguntas do público e um rápido debate com os palestrantes tendo como moderador a mesa O engenheiro-Agrônomo Dirceu Gassen.

As palestras mostraram que o ponto chave para a produtividade da cultura de verão é relacionada com o manejo de outono/inverno. Surgiram questionamentos em relação à profundidade de amostragem que de fato deveria ser utilizada, qual a melhor maneira de se distribuir os nutrientes no perfil do solo, alguns exemplos de espécies que podem ser utilizadas para essa melhoria do solo, e as possibilidades que os sistemas integrados oferecem para o aumento da matéria orgânica.

Nutrição em sistemas: mais do que NPK

A segunda parte do evento iniciou com a palestra do engenheiro agrônomo Diego Guterres, especialista agronômico da Yara Fertilizantes. Guterres abordou a dinâmica dos nutrientes que muitas vezes não são levados em consideração para altas produtividades, e o manejo que pode ser feito em relação a isso. Inicialmente foram abordados alguns aspectos do funcionamento da fertilidade do solo, como os fatores que influenciam na dinâmica dos nutrientes no sistema solo/planta, em especial questões que influenciam na absorção de nutrientes pelas plantas (água, oxigenação, temperatura e concentração) e também fatores do próprio solo que alteram a disponibilidade dos elementos.

Na sequencia detalhou-se aspectos do manejo de cada nutriente em específico. Primeiramente, ele comentou sobre os elementos que podem ter grande efeito na fixação biológica do nitrogênio, tais como o molibdênio. Outro elemento abordado pelo agrônomo foi o zinco, que é afetado por doses de fósforo elevada e pH reduzido. Diego trouxe alguns dados mostrando a influência do zinco no aumento do peso de grãos em determinadas culturas.

O especialista falou a respeito da importância do boro na nutrição de plantas quando há alta produtividade, e das características desse elemento no sistema solo/planta. Além disso, explicou também sobre a utilização do enxofre, e como está crescente a necessidade das culturas por esse elemento, devido ao papel desse na fisiologia em plantas com altas produtividades e concentrações altas de óleo e proteína no grão.

Finalizando, o agrônomo comentou a respeito do manejo do potássio, que muitas vezes tem sido deixado de lado e é um nutriente essencial para um bom desenvolvimento da planta, focando em especial na questão da distribuição de má qualidade que acaba sendo um fator limitante.

Adubação para o Sistema Plantio Direto de alta produtividade

A palestra do Dr. Pedro Escosteguy, professor da Faculdade de Agronomia da Universidade de Passo Fundo, tratou da adubação para o Sistema Plantio Direto de alta produtividade. O professor iniciou a palestra comentando sobre os fatores que limitam o rendimento de grãos, e também conceituou e explicou a respeito do que seria um solo com fertilidade construída.

Ele especificou as práticas que são necessárias para estabelecer um solo com qualidade superior, mostrando cada um dos objetivos de tais práticas. Entre essas práticas estão a calagem, a gessagem e a correção (física e de nutrientes); o estabelecimento do sistema de plantio direto, associado com adubação de manutenção, para que em um sistema já estabelecido, realizar-se apenas adubação de reposição e controle da acidez.

Segundo ele, as etapas para um solo com fertilidade construída começam com um bom diagnóstico de solo, de forma que se tenha informações suficientes para planejar a correção do solo, antes de implementar o sistema planto direto. Após o estabelecimento do sistema plantio direto, o objetivo é aumentar a quantidade de biomassa para futuramente manter um nível alto de matéria orgânica do solo, essencial para manter a qualidade do solo e por consequência, altas produtividades.

O professor explicou os teores de nutrientes considerados referência para a realização da correção e suas respectivas doses para essa correção, segundo o manual de adubação e calagem para os estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

Escosteguy também comentou a respeito das interações que ocorrem entre os nutrientes, no solo e sobre a necessidade de uma inoculação eficiente em soja para uma fixação biológica de nitrogênio que consiga suprir a necessidade de nitrogênio da planta. Para Escosteguy, a adubação eficiente depende de estimativas mais precisas de demanda e crédito de nutrientes no sistema.

Foram apresentados dados a respeito do crédito de nitrogênio que determinadas espécies fornecem para o sistema e que podem auxiliar na demanda de nitrogênio da soja. O professor falou a respeito da quantidade de nutrientes que são exportados ou ciclados pelas culturas e utilizou esses valores para propor cálculos para adubação, baseado em quanto o sistema consegue suprir os nutrientes das culturas.

Foi apresentado um estudo recente da Universidade de Passo Fundo avaliando a quantidade de nutrientes nos grãos de determinadas cultivares (exportação de nutrientes). Esses dados sobre cada cultivar podem fornecer informações para calcular doses para adubação de reposição, que é a adubação feita em solos com a fertilidade já construída, utilizada para a reposição dos nutrientes extraídos e exportados pelas culturas após o ciclo.

As bases para o Sistema Plantio Direto de alta produtividade: calagem e gessagem

O encerramento do evento aconteceu com a palestra do Dr. Eduardo Fávero Caires, da Universidade Estadual de Ponta Grossa, que abordou a correção do solo com o uso do calcário e gesso para altas produtividades em um sistema produtivo. Inicialmente, ele falou sobre os fatores que influenciam o crescimento radicular (clima, a própria planta e o solo) e sobre situações do solo que comprometem o comprimento e distribuição do sistema radicular das plantas, como a falta de cálcio e excesso de alumínio.

Segundo Caires, o comprimento do sistema radicial é importante, mas a distribuição deste é fundamental. O palestrante mostrou dados da Comissão Estratégica de Soja do Brasil, em que a formação de um perfil de solo com boa qualidade permite o crescimento radicial e por consequência, altas produtividades. O professor explicou quais as origens da acidez do solo, seus problemas e quais as dificuldades na aplicação do calcário em sistema de plantio direto estabelecido.

Também falou sobre a mobilidade do calcário no solo ao longo do tempo, sobre a eficiência dos calcários e a influência da qualidade do Plantio Direto nos efeitos da correção do solo, em especial o aumento da quantidade de Carbono no sistema. Um dos efeitos citados pelo aumento de carbono orgânico é a diminuição das espécies tóxicas de alumínio no perfil do solo.

Além disso, foi demonstrado alguns estudos mostrando como o efeito prejudicial do alumínio é potencializado em situações de deficiência hídrica no solo. O professor também explicou algumas recomendações para a avaliação e recomendação da calagem nos solos da região sul. Na segunda parte da palestra, Caires explicou o mecanismo de funcionamento do gesso aplicado no solo, sobre algumas situações que podem ocorrer ou não com os nutrientes como o potássio e o magnésio presentes no perfil em função desse gesso e, também, os efeitos que esse insumo pode ter no solo e nas culturas, mostrando resultados de experimentos.

O professor ainda exibiu resultados de trabalhos mostrando a diferença no nível de resposta à utilização de gesso nas culturas de milho e soja, e também o fato da resposta ser maior ou menor em várias culturas (milho, soja, trigo, cevada) dependendo das condições hídricas no campo. Por fim, o palestrante tratou da divergência que ocorre nas definições das doses de gesso nas diferentes localidades do país.

Ele mostrou uma proposta de método para definição da dose para o sul do país, definindo a camada diagnóstica como 20-40 cm, e calculando a dose para elevar a saturação de cálcio na CTC efetiva do solo para 60%. Após a última palestra, foi realizada a sessão de perguntas e debate com os palestrantes sob a coordenação do Engenheiro Agrônomo Fabiano Paganella, da Plantec A.P., de Vacaria/RS. Essa discussão fez o encerramento da programação do Encontro Técnico sobre Fertilidade do Solo e Nutrição de Plantas em sua primeira edição.