Nos últimos anos, a agricultura brasileira vem enfrentando diversos desafios fitossanitários, dentre eles o aumento de plantas daninhas resistentes a herbicidas, situação que vem elevando os custos de produção e estimulando novos estudos de manejo. O mais novo relato de uma planta daninha resistente que vem causando grande impacto para o agronegócio foi o Amaranthus hybridus com resistência múltipla aos herbicidas glifosato e aos inibidores de ALS (Oliveira et al, 2019).
O gênero Amaranthus compreende cerca de 70 espécies distribuídas principalmente nas regiões tropicais e subtropicais do mundo. Nesse gênero são observadas tanto plantas monóicas como dióicas. Cerca de 20 dessas espécies são consideradas plantas daninhas, causando redução da produtividade das culturas e afetando a qualidade dos grãos.
A redução na produtividade, devido à competição com plantas de caruru, pode chegar a 50% no milho, 68% na soja e 70% no algodão (Gossett et al. 1992; Klingaman e Oliver 1994; Vizantinopoulos e Katranis 1998).
As plantas conhecidas no Brasil como caruru-roxo, caruru-bravo ou simplesmente caruru, originárias da América do Sul, eram classificadas como pertencendo à espécie A. quitensis até certo tempo atrás, contudo estudos mostraram que não havia diferenças genéticas ou morfológicas que justificassem a separação destas espécies, com relação à espécie originária da América do norte e central conhecida como A. hybridus. Assim, foi convencionado identificar todas plantas com tais características como A.
Por se tratar de uma planta com rota fotossintética C4, tem grande capacidade de competição por água, luz e nutrientes e apresenta crescimento rápido. A identificação no campo dessa espécie pode ser difícil devido à similaridade entre as espécies dentro do gênero Amaranthus e ainda à capacidade que estas têm em se adaptarem a diferentes ambientes, muitas vezes mudando suas características morfológicas (Figura 1).
No mundo, já foram relatados 32 casos de resistência em A. hybridus, distribuídos em 11 países. Estes casos foram reportados a 5 diferentes modos de ação: Inibidores da ALS, EPSPS, PROTOX, fotossistema II e mimetizadores de auxinas (Heap et al., 2020). Na América do Sul há casos relatados na Argentina, Bolívia e Brasil.
Na Argentina, país onde a espécie é responsável por prejuízos significativos, o primeiro relato de resistência aconteceu em 1996, relacionado a herbicidas inibidores de ALS. No ano de 2013 foram observados os primeiros casos de resistência a glifosato e em 2014 o primeiro relato de resistência múltipla a glifosato e ALS.
Em 2016 foi reportada a resistência aos herbicidas mimetizadores de auxina (2,4-D e dicamba), bem como casos de resistência múltipla a glifosato e auxínicos. Atualmente estima-se que 20 milhões de hectares no país sejam afetados pela presença de caruru resistente (Aapresid, 2020), o que fez com que os produtores adotassem novas práticas de manejo, como a intensificação do uso de herbicidas pré-emergentes.
No Brasil, o primeiro relato de A. hybridus resistente foi em 2018, sendo um caso de resistência múltipla a glifosato e clorimuron, identificado no município de Pelotas, no Rio Grande do Sul (Oliveira et al, 2019). Nos ensaios de curva de dose-resposta para glifosato, observou-se o fator de resistência de 182 e que doses acima de 46.000 g e.a./ha de glifosato (64 vezes a dose recomendada em bula) não controlaram as plantas da população resistente (Figura 2).
Já para clorimuron, o fator de resistência ficou em torno de 80 e a dose de 320 g i.a./ha (16 vezes a dose recomendada em bula) não controlou as plantas da população resistente. Os resultados demonstram que a população estudada tem um alto nível de resistência a ambos os herbicidas (Figura 2).
O mecanismo de resistência para o herbicida glifosato, nessa população, foi identificado como sendo uma substituição tripla no gene EPSPS, conhecida como TAP-IVS. Essa mesma mutação foi identificada em populações de A. hybridus na Argentina (Perroti et.al, 2019). Esse mecanismo de resistência explica a alta tolerância que as plantas resistentes têm ao glifosato.
Referências
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