Como escolher os fertilizantes para a sua lavoura?


Autores: Luciano Colpo Gatiboni , Djalma Eugênio Schmitt
Publicado em: 28/02/2016

O mercado de fertilizantes passa por constantes mudanças no Brasil. Desde a intensificação da agricultura e a difusão do uso desses insumos, principalmente a partir da década de 1970, anualmente novos produtos chegam ao mercado como opção para o agricultor. Inicialmente existiam poucas opções de produtos, sendo restringidas a fertilizantes simples ou misturas contendo NPK.

Da década de 70 até os anos 2000 outros produtos foram paulatinamente aparecendo no mercado, como os fosfatos naturais, os termofosfatos, os fertilizantes com NPK no grânulo, NPK com micronutrientes, NPK com macronutrientes secundários (Ca, Mg e S), fertilizantes organominerais, fertilizantes foliares, dentre outros (a lista é longa).

Mais recentemente, principalmente a partir do ano 2010, uma “nova classe” de fertilizantes surgiu no mercado brasileiro: os fertilizantes de eficiência aumentada ou, como comumente chamados, os fertilizantes “inteligentes”. Esses fertilizantes contêm aditivos e/ou inibidores que diminuem as perdas dos nutrientes, aumentando sua eficiência.

Além disso, existem ainda outros produtos que não se tratam de fertilizantes, pois não contém nutrientes, mas têm sido oferecidos no mercado com o objetivo de aumentar a eficiência das plantas em utilizar os nutrientes já existentes no solo. Por tudo isso, não é necessário ressaltar que, com as inúmeras opções disponíveis, e mais as novidades de cada ano, o agricultor se sinta confuso no momento de escolher os produtos para sua lavoura.

Porém, nem todos produtos geram dúvidas na hora da compra, já que alguns são usados com tanta frequência que o produtor já os conhece bem, como exemplo o calcário e os fertilizantes tradicionais contendo N, P e K (como ureia, superfosfato triplo, superfosfato simples, cloreto de potássio, sulfato de amônio, fertilizante NPK formulado, etc.).

Para esses produtos consagrados não é necessária propaganda, pois o produtor sabe o que esperar deles e os usará quando necessário. Além desses fertilizantes consagrados, há aqueles produtos cujo uso pode ou não trazer benefícios, dependendo da situação.

Esses produtos já demandam do produtor um conhecimento técnico mais aguçado, a fim de identificar as situações de campo onde um produto diferenciado pode ser vantajoso. Por exemplo, um fertilizante NPK que contém enxofre em sua fórmula pode ser altamente vantajoso, se o solo necessitar enxofre. Por outro lado, esse fertilizante pode não trazer nenhum benefício extra em relação ao fertilizante NPK comum, caso o solo já possuir teores adequados de enxofre.

O mesmo raciocínio pode ser feito para a escolha de um fertilizante comum ou um com micronutrientes, onde a pergunta a ser feita é simplesmente:

Meu solo precisa de micronutrientes? Para ter a resposta para essa pergunta, a boa e velha análise de solo deve estar sempre por perto do agricultor. No mesmo sentido, as dúvidas podem ser muitas outras, como: Fertilizante comum ou organomineral? Calcário comum ou calcítico? Calcário puro ou misturado com gesso? Fosfato solúvel ou fosfato natural? Ureia comum ou com inibidor? Fertilizante comum ou de liberação controlada? Ureia ou sulfato de amônio? Fertilizante via solo ou foliar? etc., etc., etc.

Todas essas dúvidas são respondidas com conhecimento técnico, onde deve-se saber qual o benefício de cada opção e se este benefício é vantajoso ou desnecessário para a situação onde se pretende usar os fertilizantes. Mas, infelizmente, também há no mercado produtos onde para os quais há pouca informação sobre seu desempenho, normalmente porque são produtos novos, em que há pouca pesquisa científica ou são ainda pouco usados pelos agricultores.

Para alguns desses produtos, cuja comprovação técnica ainda é escassa, os agricultores ficam à mercê dos resultados e informações disponibilizadas pelos fornecedores dos insumos, o que pode não ser o mais adequado. Para os produtos cuja eficiência é pouco conhecida, embora eles mereçam o benefício da dúvida, racionalmente, acreditamos que o produtor deveria primeiramente testá-los em uma parte da lavoura.

Depois, se a vantagem for comprovada, no próximo cultivo pode-se investir mais nos mesmos. Mais adiante nessa reportagem será explicado como realizar em casa um bom teste de produtos.

A essa altura o leitor deve estar se perguntado por que não há mais informações técnicas seguras sobre os novos produtos ou, ainda, como alguns produtos usados pelos agricultores podem não ser recomendados pelas instituições de pesquisa.

Há vários motivos e atores, pois de um lado, há a demora normal da geração de informações pela pesquisa, de outro o encolhimento da extensão rural pública no Brasil; há ainda aspectos relacionados à legislação brasileira para registro de fertilizantes e, por último, aspectos relacionados ao próprio processo de compra/venda do produto.

Abordaremos todos esses aspectos a seguir. Sobre os resultados de pesquisa demorarem, isso é fruto do rigor necessário para se obter conclusões seguras, pois para a obtenção de dados concretos que suportem a recomendação dos insumos precisa-se um volume grande de dados, com testes realizados em diversos locais, em diferentes situações de manejo e em diferentes anos.

Essa repetição dos testes é importante porque nossa agricultura usa uma grande diversidade de solos, de culturas, de manejos adotados, além de microclimas e demais fatores ambientais, os quais fazem com que os resultados de pesquisa sejam, às vezes, conflitantes (produtos podem ser ora recomendados, ora não, dependendo da situação).

Por isso, as recomendações devem ser cautelosas e baseadas em vários experimentos, a fim de se evitar recomendações generalizadas baseadas em dados iniciais, que poderiam levar a erros de recomendação.

A consequência disso é que novos insumos são frequentemente oferecidos ao agricultor e a pesquisa não tem condições de dar respostas imediatas sobre a eficácia de tal insumo, restando ao agricultor a opção de usar por sua conta e risco, as vezes influenciado pela opinião distorcida do vendedor.

Cabe lembrar ainda que no Brasil, infelizmente, a pesquisa científica ainda depende muito de financiamento público e, pela escassez deste, muitas pesquisas importantes para o agricultor ainda estão engavetadas, aguardando recursos para sua execução.

No que tange à ajuda da extensão rural na escolha ou recomendação de produtos, é visível que a grande expansão da agricultura nas últimas três décadas no Brasil não foi acompanhada por uma expansão das empresas públicas de extensão rural, como a Emater e a Epagri (Para o RS e SC, respectivamente). Não tendo como atender a todos, observa-se que a extensão pública priorizou, com razão, os agricultores com menos recursos.

Ao mesmo tempo, no outro extremo, as grandes empresas agrícolas recorreram à assistência técnica privada. Entre os pequenos e os grandes agricultores, restaram muitos médios agricultores que ficaram sem assistência técnica. Isso fez se multiplicar no Brasil a atuação a assistência técnica privada “gratuita”, financiada por empresas comercializadoras de insumos.

A dúvida que surge com esse tipo de assistência é se ela é justa na hora de recomendar ou não os produtos para o agricultor. Já no que tange à legislação, o leitor pode se perguntar: Se um produto pode não cumprir o que promete, como ele pode ter sua comercialização liberada? Acontece que até a pouco tempo atrás a legislação brasileira para o registro de fertilizantes era muito desatualizada e permissiva.

Felizmente, atualmente está em processo de implementação um novo conjunto de normas que exigirão comprovações de eficiência mais rígidas para o registro de produtos, fazendo com que no futuro haja uma pré-seleção mais rigorosa dos produtos a serem comercializados.

Sem mágicas

Sobre o processo de escolha dos produtos pelo agricultor, podemos falar finalmente do processo de compra/venda, onde os sujeitos envolvidos são o vendedor e o comprador. Enfatizamos que desses sujeitos, sempre o agricultor deve ser o mais poderoso, pois é quem tem o dinheiro e o poder de decisão na mão.

Contudo, infelizmente, as vezes o agricultor está à procura de um produto que milagrosamente multiplique seus lucros, ficando assim suscetível ao discurso fácil de vendedores de milagres. Quando o processo de vendas não é saudável, estratégias de vendas injustas podem ser utilizadas para que o produtor tome uma decisão rapidamente, sem pensar muito.

Dentre as estratégias desleais podemos citar:

  • o princípio da escassez (o produto está faltando no mercado, você tem que comprar agora!);
  • o princípio da urgência (se comprar o produto agora ganha um desconto, mas tem que decidir agora!);
  • o princípio da autoridade (o produto foi recomendado por pesquisadores de várias universidades – porém não cita quem são);
  • o princípio da prova social (o “seu fulano” está usando nosso produto!), dentre várias outras estratégias de convencimento.

Para evitar escolhas malsucedidas, gostaríamos de deixar a seguinte mensagem:

Caro agricultor, não há mágica na agricultura! Desconfie sempre quando a oferta parece boa demais para ser verdade. Se nós pudéssemos aconselhar alguém, diríamos para desconfiar imediatamente de:

a) produtos onde poucos quilos ou litros substituem grandes quantidades dos insumos convencionais (não existe mágica na agricultura!);

b) produtos cujo mecanismo de ação vai contra o que se conhece de química e fertilidade do solo (não existe mágica!);

c) produtos cujo mecanismo de ação ainda é “desconhecido”, mas dizem que funciona (mágica?), ou, ainda, cuja explicação do mecanismo de ação é tão complexa que ninguém consegue entender.

Tirando de nosso foco de discussão os produtos “duvidosos” citados anteriormente, para os quais pedimos muita cautela na compra, e pensando numa decisão entre um produto tradicional ou um fertilizante alternativo ou de eficiência aumentada, sugerimos ao agricultor, como recomendação geral, três regras básicas para ajudar na escolha dos produtos.

REGRA Nº 1 – Só aplique os nutrientes se houver recomendação técnica de aplicação, ou seja, não se deve estocar nutrientes no solo (melhor guardar o adubo no galpão ou, melhor ainda, investir os recursos em algo que trará retorno).

Para isso, é imprescindível ter conhecimento do estado de fertilidade do solo através de análise de solo frequente e realizar uma adequada recomendação de fertilizantes, seguindo as necessidades do solo e da cultura.

REGRA nº 2 – Nunca escolher o produto pelo valor do produto comercial (preço da saca), mas sim calcular o custo real do fertilizante pelo teor de nutrientes, pois esse é o único parâmetro seguro para cálculo do custo real do fertilizante.

Por exemplo: Qual fertilizante seria mais caro:

Ureia (R$1.470,00/tonelada), sulfato de amônio (R$1.105,00/tonelada), ou nitrato de amônio (R$ 1.340,00/tonelada)?

O cálculo pode ser feito conforme indicado no Quadro 1, onde se pode observar que no exemplo utilizado a ureia é mais barata que os demais fertilizantes (R$ 3,27/kg de N, contra R$5,52 e R$4,19/kg de N para os demais fertilizantes do exemplo).

Cabe ressaltar aqui que pode ser mera especulação quando, para fins de convencimento, é dito que um determinado fertilizante tem eficiência maior e por isso, o maior custo por unidade de nutriente possa ser compensado, ou que se pode aplicar menos daquele fertilizante (ver regra nº 3 a seguir).

A REGRA nº 3 para a escolha dos fertilizantes consiste em ponderar o custo-benefício da substituição de um fertilizante por outro. Infelizmente, isso só é possível para aqueles fertilizantes para os quais se sabe o aumento de benefício que eles trazem. Como exemplo, aplicaremos a Regra nº 3 para os fertilizantes do Quadro 1.

É bastante conhecido pelos resultados científicos que uma das principais formas de perda de N da ureia é por volatilização de amônia e que essas perdas ficam, normalmente, ao redor de 20 a 40% do N aplicado (usaremos no exemplo um valor de 30% de perdas por volatilização).

Por outro lado, sabemos que a substituição da ureia por fontes como o sulfato ou nitrato de amônio praticamente extinguem as perdas por volatilização de amônia. Assim, substituindo ureia por sulfato ou nitrato de amônio, teríamos um aumento de 30% da eficiência (não haveria perdas por volatilização).

Contudo, ao comparar o custo real (CR) desses fertilizantes no Quadro 1, vemos que o sulfato tem um Custo Real por kg de N 69% maior que a ureia e o nitrato de amônio têm Custo Real por kg de N 28% maior que a ureia.

Assim, no exemplo, considerando um aumento de eficiência de 30% pela troca do produto, a relação custo-benefício não seria favorável para o sulfato de amônio (custo = +69%, benefício = +30%), enquanto o custo benefício quase empataria no nitrato de amônio (custo = +28%, benefício = +30%). É importante ressaltar que para usar a Regra nº 3, precisa-se ter um bom conhecimento técnico e informações disponíveis para estimar, por exemplo, qual as perdas de N médias por volatilização de N.

Outra possibilidade de uso da Regra nº 3 é quando temos a informação do incremento de produtividade ocorrido com o uso de um certo fertilizante. Neste caso, calcula-se o custo-benefício baseado no incremento monetário pela maior produtividade.

Como exemplo, usaremos os dados do Quadro 2, onde um fertilizante de eficiência aumentada melhorou a produtividade de uma lavoura de soja em 10%, aumentando de 60 sc/ ha para 66 sc/ha.

Neste caso, o custo aumentou em R$ 426,80 por hectare ao se utilizar o fertilizante diferente (R$ 858,00 - 431,20 = 426,80) e o benefício foi de R$ 450,00 (seis sacas de soja a R$75,00 cada).

Mostrando, portanto, que no exemplo teríamos um pequeno benefício ao utilizar o fertilizante de eficiência aumentada. O exemplo do Quadro 2 é bem ilustrativo, pois mostra exatamente o que é muito comum acontecer no campo:

A substituição de um insumo por outro mais moderno (e mais caro) fica com um custo-benefício quase empatado e, assim, por vezes, há vantagem em seu uso e por vezes não há, dependendo muito das condições locais de cada lavoura (solo, microclima, variedade, época de semeadura, tratos culturais, etc.) e do preço de venda dos produtos colhidos.

Por isso, reforçamos o que foi dito no início dessa reportagem: Deve-se inicialmente testar os produtos apenas em uma parte da lavoura e monitorar se o investimento extra vale a pena.

Caso haja vantagem comprovada, na próxima safra pode-se investir mais no produto. Na hora de fazer esses testes de lavoura há uma coisa muito importante para que o mesmo traga informações seguras:

é importantíssimo um teste de produto conter a comparação de três situações:

1) uma pequena área (parcela) usando os fertilizantes tradicionais que o produtor já está usando no seu manejo, nas doses normalmente usadas;

2) uma parcela usando o fertilizante a ser testado, nas doses recomendadas pelo fabricante;

3) Uma parcela sem usar nenhum dos dois (nem o fertilizante tradicional, nem o que está sendo testado).

A terceira parcela, sem fertilizante, é muito importante porque muitos dos nossos solos já estão com teores elevados de nutrientes e na verdade não há resposta a aplicação de nenhum fertilizante.

Se no teste não existir essa terceira parcela, os dois fertilizantes (o tradicional e o novo) podem parecer ter a mesma eficiência, mesmo que o “novo” tenha sido aplicado em uma quantidade menor que o tradicional, levando a uma conclusão errada sobre a eficiência do produto.

Então, finalizando, o produtor pode se munir de algumas ferramentas apontadas aqui para tomar uma decisão mais segura na hora de escolher os produtos que aplica em sua lavoura.

Vale lembrar também que se a dúvida persistir, é só entrar em contato pedindo esclarecimento para algum pesquisador de uma Faculdade de Agronomia ou Instituição de Pesquisa ou Extensão Rural da sua região.

Temos certeza que eles podem ajudar com uma opinião sensata e isenta sobre o assunto.