Estratégias de manejo de lavouras para altos rendimentos de grãos


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Publicado em: 31/10/2014

A Casa do Plantio Direto tem em sua origem o debate dos problemas encontrados pelos agricultores e a oportunidade de compartilhar soluções, inovações e boas práticas agrícolas, objetivando a sustentabilidade da produção de grãos.

Nesse texto serão discutidas algumas demandas recentes de agricultores e posicionadas opiniões sobre a influência dos processos físicos da fertilidade do solo, a armazenagem de água e a qualidade de semeadura sobre os componentes de produção de soja, milho, trigo e arroz.

Componentes do rendimento

Lavouras de altos rendimentos exigem a compreensão das necessidades das plantas e de eficiência nos processos de manejo para alcançar as produções desejadas. Manejar as culturas, portanto, exige o domínio da biologia das plantas e da lógica de formação dos componentes que determinam o rendimento de grãos.

Sabe-se que o enchimento e o peso da massa de grãos está, diretamente, relacionado com a área foliar sadia até a maturação fisiológica. A planta ajusta a área foliar remanescente durante o desenvolvimento vegetativo, para cada espiga, rácemo ou panícula. É na qualidade do processo de semeadura que se define a eficiência da área foliar para máxima produção.

O trigo e o milho têm a população de espigas como referência mais importante, seguido do número de grãos por espiga. Em soja o número de rácimos com folhas sadias e em arroz a população de panículas. Para ilustrar essa questão pode-se tomar como exemplo: 400 espigas de trigo/m2, com 40 grãos cada uma, resultam em 16 mil grãos. Com peso de 40g por mil sementes, resultará em 6.400 kg/ha.

No caso do arroz, a lógica é semelhante: 400 panículas, com 150 grãos e 25g de peso de mil sementes resultará em 15.000 kg/ha. As plantas de arroz e de trigo determinam o território com as raízes e definem o número de afilhos, na terceira semana depois da semeadura. Nessa fase os afilhos já estarão em desenvolvimento e definirão o principal componente de produção.

Em milho, 7 plantas ou espigas/ m2, com 200 g de grãos cada uma, resultará em 14.000 kg/hectare. Em soja, o equivalente a espiga é o rácimo (cacho) com uma folha sadia e exposta à radiação solar. Cada rácimo tem a expectativa de produzir 1,5g de massa de grãos (9 grãos com 166 g de PMG).

Com 20 plantas/m2, com hastes, produzindo 30 g de grãos resultará em 600 g/m2. Para cultivares com características de arquitetura de plantas sem ramos, menor distância entre nós, se pode optar por menor espaçamento entre fileiras e aumentar a população para 30 plantas/m2, e obter 20 g de grãos/planta.

Ambas as combinações resultarão em aproximadamente 400 rácimos produtivos e 6.000 kg/ha. Nessas culturas o lucro cessante com maior influência no potencial de produção está na qualidade do processo de semeadura. Elas tem necessidades semelhantes em relação a qualidade de semeadura. Sementes bem distribuídas em profundidade e espaçamento, com sulco coberto de solo. Em soja, os dados de levantamentos realizados na safra 2014-15, mostram 35% de plantas duplas (com menos de 2 cm de distância) e 20% de falhas no mesmo espaço.

A correção das plantas duplas e das falhas, combinado com a necessidade real de plantas determinará a redução na população de sementes e no desembolso para produzir. Valor que poderá ser investido na qualidade de outros processos de manejo que determinam os componentes do rendimento. A germinação e a emergência das plântulas envolvem a qualidade da semente, o tratamento para proteção e o processo de semeadura. Essa combinação interdependente determina o potencial de produção da safra.

A qualidade no processo de semeadura

A semeadura é a prática mais antiga de manejo de lavouras de grãos. Temos a segurança de afirmar que a qualidade desse processo atinge o padrão mínimo para manejo de lavouras de altos rendimentos. Entretanto, ao examinar os detalhes chegamos à conclusão de que na semeadura ocorrem os processos que mais limitam os componentes de produção de grãos.

Entre as perguntas mais frequentes sobre semeadura destaca-se a velocidade da semeadora. O tempo necessário para a soma dos processos de corte da palha, abertura para distribuição de fertilizantes e processo de semeadura é muito curto.

Com a velocidade de 7,2 km/h, cada metro de fileira será semeado em meio segundo. Isto é, com a metade de um segundo a semeadora terá que cortar a palha, abrir o sulco, distribuir o fertilizante, preparar o ambiente para a semente, posicionar 60 sementes de arroz ou trigo, 10 de soja ou 4 de milho.

Além de fechar o sulco e dar condições iguais para todas as sementes. Com velocidade reduzida para 3,6 km/h, cada metro de fileira ocupará 1 segundo, mesmo assim, um tempo muito rápido para atender as necessidades da semente e da germinação objetivando plântulas robustas. A velocidade de semeadura é definida pela resistência do solo à preparação do sulco de semeadura. Solos compactados oferecem resistência e, como consequência a formação de “leivas“ que tombam entre as fileiras de semeadura.

Solos estruturados com abundância de raízes e palha permitem a abertura e fechamento do sulco, com menor resistência e maior qualidade no processo de semeadura. A velocidade de semeadura também varia com as condições físicas do solo, as características das ferramentas de abertura e fechamento do sulco da semeadora e com as necessidades de cada espécie cultivada.

Portanto, o operador deve ajustar a velocidade de semeadura para a necessidade de posicionamento de cada semente (por exemplo, 3 cm de profundidade), espaçamento equidistante entre elas e fechamento adequado. Semeadoras modernas, com distribuição individual de sementes com tecnologia pneumática, ou controles eletrônicas representam significativa evolução, entretanto, não tem influencia direta no processo de corte da palha, preparação do ambiente de solo, profundidade exata e cobertura do sulco.

A demanda para as semeadoras está, justamente nesse processo. O preparo do ambiente para semeadura inicia na colheita da cultura anterior, com a uniformidade de distribuição da palha. Além disso, é muito importante manejar cultivos de cobertura e adubação verde para melhorar a estrutura física do solo. Os processos físicos da fertilidade do solo determinarão a compactação, a armazenagem de água, a aeração e o processo de abertura e fechamento do sulco de semeadura.

O abandono das áreas de lavouras nos meses de outono e de inverno, favorece a sobrevivência e a produção de sementes de plantas daninhas de verão. Também perdese o período para produção de palha (a pele de proteção do solo) e de raízes (os músculos da estrutura física do solo). A fertilidade do solo envolve processos químicos, físicos e biológicos. Cada um com as suas características, que necessitam ser combinados ou somados para a máxima eficiência na produção.

A fertilidade química do solo

O carbono, o hidrogênio, o oxigênio e o nitrogênio, CHON, compõem aproximadamente 95% da matéria seca vegetal. Esses quatro elementos fazem parte de ciclos gasosos, e não são armazenáveis no solo. No manejo da fertilidade do solo devem ser considerados como elementos continuamente ciclados. Portanto, a fertilidade física e biológica dependem de cobertura vegetal contínua.

Depois da adoção do plantio direto, o desafio maior é adotar a lógica da cobertura permanente do solo, com vegetação, objetivando ciclar CHON e preparar ambiente para a qualidade de semeadura. O agricultor reconhece o potencial maior da lavoura de soja com menos palha. Entretanto, o solo, para manter as metas de rendimento de grãos depende de mais palha no sistema de produção.

No caso da soja, com elevados teores de proteína, a quantidade de nitrogênio nos grãos e nas folhas é maior do que a soma dos demais elementos minerais e sais na composição da matéria seca. Os teores de nutrientes em 6.000 kg de grãos equivale 450 kg da fórmula P2O5 20%, K2O 27% e S 4%. Além de 780 kg de uréia (N 46%). Não há como produzir mais sem fornecer os nutrientes necessários na composição da planta.

Teores de nutrientes no solo

Os dados da análise de solos, em geral, apresentam os teores de nutrientes em ppm. Com base no exemplo de 8 ppm de fósforo no solo, a quantidade do nutriente disponível para a planta equivale a 8 kg/ha, na camada de 10 cm do perfil de solo. Se as raízes desenvolvem até 40 cm no perfil de solo, teremos 32 kg do elemento disponível, considerando a distribuição uniforme.

No manejo para altos rendimentos é necessário disponibilizar a quantidade necessária de sais e elementos minerais, para a meta de produção. Produzir o dobro da média registrado na região é viável e já ocorre nas melhores áreas das lavouras mais produtivas. Preparar o ambiente e as condições para maior eficiência depende do conhecimento e da atitude do agricultor.

A água na produção de grãos

Além de disponibilizar os nutrientes necessários para a obtenção de altas produtividades é necessário repor e considerar a necessidade água da planta. Para metabolizar os nutrientes, armazenar nas folhas e transferir para o enchimento de grãos, as plantas de soja consomem em torno de 1.000 litros de água para cada kg de grãos.

Portanto, a produção de uma tonelada de soja exige do agricultor a habilidade de armazenar e disponibilizar, no solo, mil toneladas de água da chuva. Com já comentado, a fertilidade do solo é composta por processos químicos, físicos e biológicos. Os processos químicos podem ser medidos, analisados e corrigidos para melhorar a disponibilidade de elementos para as plantas.

Essa parte da fertilidade é conhecida e manejada pelos agricultores. Nesse aspecto a agricultura de precisão permitiu, nos últimos anos, significativa evolução na racionalização do uso de nutrientes necessários, combinado com distribuição, de acordo com os teores disponíveis no solo.

Processos físicos da fertilidade do solo

A compactação é destacada como um dos fatores limitantes nos sistemas de produção que adotam a prática de semeadura direta. É importante destacar que o plantio direto mais frequente no Brasil, se resume a semear sem arar. Levantamentos realizados no período de outono, depois da colheita de milho e soja no verão e antes da semeadura de trigo, no Rio Grande do Sul e Santa Catarina, mostram 96% das áreas em pousio.

Trata-se do abandono das lavouras no outono, deixando espaço e favorecendo que as plantas daninhas desenvolvam e produzam sementes. A compactação de solos, de forma mais simples, é a perda de espaços livres destinados à armazenagem de ar e água pelo adensamento. As causas do adensamento estão diretamente relacionados com a desestruturação mecânica por arados, escarificadores e grades e pelo exagerado passeio de máquinas, especialmente sobre solos manejados com elevados teores de umidade.

Como princípio pode-se afirmar que “as raízes nunca compactam o solo” e “a preparação mecânica e o passeio de máquinas sim”. Para entender o processo de estruturação do solo adequado ao desenvolvimento das culturas, é necessário entender o crescimento das raízes e os processos envolvidos na produção de exsudados e na formação de glomalina. As raízes crescem continuamente para absorver água e “beber“ sais e elementos minerais.

Além de extrair os nutrientes necessários, as raízes, por meio da glomalina desenvolvem estratégias de defesa para se proteger contra patógenos, nematoides, insetos e para “marcar território” contra o desenvolvimento de raízes de outras plantas, que podem ser da mesma espécie (plantas dominadas) ou de plantas daninhas, cujo antagonismo é conhecido como alelopatia.

Diante disso, entender os mecanismos de produção de exsudados pelos diferentes sistemas radiculares de plantas é o fundamento para compreender a importância em investir na cobertura permanente do solo e em práticas de adubação verde, nos intervalos entre culturas destinadas a geração de renda.

A falta de conhecimento sobre raízes, exsudados, glomalina e atividade biológica no ambiente do sistema radicular, leva ao sistema primitivo de subsolar, arar, gradear e passear com máquinas pesadas em solos destinados ao desenvolvimento de raízes de plantas e de armazenagem de água das chuvas.

As raízes constroem estrutura de solo para crescer, extrair nutrientes e proteger-se contra agentes bióticos e abióticos. Depois de completar o ciclo biológico da cultura, o sistema radicular morto mantém a estrutura contendo material orgânico e poros para armazenar água, gases e permitir o desenvolvimento de raízes de outras plantas na sequência.

Essa estrutura de microporos, com menos de 0,5 mm de diâmetro, é a chave para os processos físicos da fertilidade do solo, especialmente para a armazenagem de água disponível para as plantas. Solos com abundância de raízes tem até 25% de seu volume em capacidade para armazenar água. Em termos médios, os solos de lavouras no Brasil tem 11% de microporos.

Com base nesse dado, a camada superficial de 10 cm (100 mm) da superfície do perfil de solo tem espaço para 11 mm de água (11 litros/m2). Se o solo tiver a mesma estrutura até 40 cm de profundidade, a capacidade de armazenar água será de 44 mm.

O que equivale a 44 litros de água por metro quadrado. Por outro lado, ao mensurar a compactação causada pelo passeio de tratores, semeadoras, colhedoras, pulverizadores, aplicadores de fertilizantes e caminhões, muitas vezes, constata-se o “afundamento“ de mais de 4 cm. Isso equivale ao 10% de poros disponíveis na camada de 40 cm do perfil de solo, praticamente, eliminando o espaço disponível para armazenar água.

É importante destacar que os solos arenosos tem maior facilidade para compactação e são mais difíceis de descompactar ou reconstruir poros. Portanto, a fertilidade de solos para altos rendimentos de grãos exige a compreensão dos componentes que definem a produção da massa de grãos. É necessário considerar as necessidades das raízes, da água disponível para a fisiologia da planta, a fotossíntese e a produção de fotoassimilados.

Diante do que foi discutido, pode-se considerar que os processos físicos da fertilidade do solo têm importância semelhante aos processos químicos e biológicos e, no entanto, muitas vezes são minimizados. Lavouras de altos rendimentos exigem planejamento de sistemas de produção equilibrados envolvendo a rotação de culturas, a adubação verde, a armazenagem de água e a supressão biológica natural de pragas, patógenos e plantas daninhas.

Conclusões

  • A produção de grãos exige do assistente técnico e do agricultor a compreensão clara dos componentes que determinam a produção, de cada espécie.
  • Cada cultivar apresenta características de arquitetura das plantas e de necessidades de manejo diferentes, combinado com a fertilidade do solo para obter máximos rendimentos.
  • A qualidade no processo de semeadura pode determinar os maiores índices de ganhos nas metas de aumento na produção.
  • As raízes nunca compactam o solo, elas constroem a estrutura por meio de exsudatos e produção de glomalina em simbiose com microrganismos.
  • O passeio de máquinas e a preparação física com escarificadores, arados e grades são as principais causas de compactação do solo.
  • A necessidade de melhorar os processos físicos da fertilidade de solos se amplia com a necessidade de proteção contra pragas.
  • A fase de conforto e de facilidade na proteção de plantas com agroquímicos passou, depois da ocorrência de populações resistentes de plantas daninhas, pragas e patógenos.
  • Há necessidade de combinar práticas de rotação de culturas, de diversidade de biomassa vegetal, de supressão biológica natural com os agroquímicos remanescentes e ativos sobre os alvos desejados.