Manejos do solo no estabelecimento e desenvolvimento de soja em áreas de arroz irrigado


Autores: Lucas Lopes Coelho, Enio Marchesan, Gerson Meneghetti Sarzi Sartori, Augusto Dubou Serafin, Gabriel Donato, Bruno Behenck Aramburu, Alisson Fleck, Eduardo Iansen Cassanego
Publicado em: 30/04/2020

1 Contextualização

A soja é uma das culturas de maior importância mundial, sendo o Brasil o maior exportador e segundo maior produtor do grão, com uma produção de 114,8 milhões de toneladas na safra agrícola 2018/19 (CONAB, 2020). Em âmbito nacional, o estado do Rio Grande do Sul (RS) se destaca como um dos maiores produtores do país, com uma área semeada de aproximadamente 5,7 milhões de hectares na referida safra (CONAB, 2020). No estado, o cultivo da leguminosa historicamente se concentrou nas chamadas terras altas, principalmente no Planalto gaúcho. No entanto, devido aos preços alcançados pela cultura nas últimas safras, associado à possibilidade de rotacionar mecanismos de ação de herbicidas, a soja tem despertado o interesse de produtores inseridos no ambiente de terras baixas na metade sul do estado.

O RS possui três milhões de hectares com a infraestrutura necessária para o cultivo do arroz irrigado (BAMBERG et al., 2009). Destas, anualmente, cerca de um milhão são destinadas ao cultivo do cereal, permanecendo o restante das áreas subutilizadas em relação ao seu potencial de produção. Diante disso, a soja ingressou inicialmente nesse ambiente como uma ferramenta para reincorporar ao sistema produtivo do arroz áreas com elevada infestação de plantas daninhas, com destaque para o arroz vermelho (Oryza sativa L.), capim arroz (Echinochloa spp.) e ciperáceas (Cyperus spp.) resistentes a herbicidas.

Contudo, diversos são os desafios para que se tenha um cultivo rentável de soja nessas áreas. Dentre as principais limitações, podem-se destacar as características intrínsecas associadas às circunstâncias de manejo dos solos (principalmente Planossolos e Gleissolos), os quais apresentam drenagem deficiente, presença de camada compactada próxima à superfície, reduzida capacidade de infiltração de água no perfil, baixo teor de matéria orgânica e reduzida disponibilidade de nutrientes quando não submetidos ao alagamento (GOMES et al., 2006). Assim, manejos do solo que visem mitigar tais adversidades, com foco na redução dos estresses hídricos às plantas são fundamentais para viabilizar, técnica e economicamente, um sistema de rotação e/ou sucessão de culturas nesse ambiente.

Nesse sentido, Marchesan (2013) destaca que a escolha da área (risco de enchente), associada à adequação da mesma através do nivelamento superficial, da drenagem de superfície e da correção do pH surgem como primeiros aspectos técnicos a serem observados. Na sequência, a determinação da presença de limitações de ordem física do solo, bem como de suas características, são pontos chaves e irão nortear a escolha do manejo mais adequado a ser adotado na área.

Assim, na busca por manejos que viabilizem o melhor desenvolvimento de raízes da soja em profundidade, surgem como possibilidades os manejos mecânicos de solo durante a entressafra, tais como a escarificação e a gradagem profunda, os quais quando realizados com umidade adequada, resultam em melhorias na macroporosidade e, consequentemente, na permeabilidade ao ar e na condutividade hidráulica do solo (NUNES et al., 2014, GUBIANI et al., 2018). Outra opção é a utilização da própria semeadora adubadora através de seus mecanismos sulcadores responsáveis pela deposição do fertilizante, tal como a haste sulcadora quando utilizada na tentativa de aliviar os estresses as plantas na linha de semeadura.

Outro ponto a ser destacado para o sucesso do cultivo da soja em áreas de arroz refere-se à qualidade de semeadura e ao estabelecimento inicial de plantas, os quais têm sido reportados como frequente empecilho na busca por elevadas produtividades nessas áreas.

Nessa perspectiva, Vizzotto (2014) cita que a utilização da haste sulcadora proporciona maior mobilização do solo na linha de semeadura, resultando no aumento da desuniformidade de distribuição das sementes em profundidade e, por conseguinte, influenciando o estabelecimento inicial das plantas.

Ademais, manejos mecânicos que proporcionam a desestruturação física do solo em superfície tendem a prejudicar a qualidade do processo de deposição de sementes. Segundo Filho et al. (2007), equipamentos como a grade e até mesmo escarificadores promovem o aumento da rugosidade da superfície em função do elevado volume de solo mobilizado, assim, dependendo do intervalo de tempo entre o manejo e a semeadura, bem como das condições de precipitação, pode haver prejuízos sob a qualidade de distribuição de sementes.

Em consonância com tais necessidades de informação, o Grupo de Pesquisa em Arroz Irrigado e Uso Alternativo de Áreas de Várzea (GPAI) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), vêm desde 2010 trabalhando com o intuito de compreender o impacto de manejos do solo visando à melhoria do ambiente radicular sobre o estabelecimento inicial, desenvolvimento de plantas e produtividade de soja em áreas de arroz irrigado com camada com elevado grau de compactação. Dentre os principais manejos testados para alcançar tais objetivos, pode-se destacar os manejos do solo (gradagem, escarificação e camalhão), e também de mecanismos sulcadores associados à semeadora adubadora, com destaque para o disco duplo, disco turbo e haste sulcadora.

 

2 Resultados obtidos Estabelecimento da lavoura

O estabelecimento de plantas tem sido um desafio constante para os produtores de soja em áreas de arroz irrigado, se constituindo como um dos principais fatores limitantes à produtividade de grãos. Assim, após a escolha das variedades melhores adaptadas, bem como dos lotes de sementes de maior vigor, pois nesse ambiente os estresses são maiores, atenção especial deve ser dada para os parâmetros de plantabilidade.

Nessa perspectiva, Bottega et al. (2014) citam que a qualidade do processo de semeadura é decisiva no estabelecimento das culturas, sendo responsável por viabilizar uma adequada população inicial de plantas. Desta forma, os mecanismos da semeadora devem proporcionar a correta distribuição das sementes (profundidade e distância), associado a um bom contato da semente-solo, viabilizando assim, que o processo germinativo se complete no menor tempo possível.

Contudo, manejos do solo e/ou de mecanismos sulcadores utilizados com o intuito de melhorar o ambiente radicular (tema abordado mais adiante) podem prejudicar esse delicado processo. Nesse sentido, a utilização da haste sulcadora na deposição do fertilizante tem sido motivo de controvérsias entre produtores e técnicos, principalmente pelo fato de ocasionar elevada mobilização de solo imediatamente antes da passagem do mecanismo dosador de sementes. Nessa perspectiva, o GPAI tem dedicado esforços na tentativa de desenvolver um mecanismo de acomodação de solo (Figura 4A) acoplado a semeadora adubadora, o qual tem como objetivo principal auxiliar na melhoria dos parâmetros de plantabilidade, com foco na profundidade de deposição e no contato semente solo.

Como resultado da utilização do mecanismo de acomodação do solo após a haste sulcadora e antes do disco duplo da semente na safra 2019/20, observou-se que o mesmo reduziu em 41% a desuniformidade na profundidade de deposição entre as sementes quando comparado aos demais tratamentos testados. Como consequência, houve também redução na amplitude de deposição entre as sementes em profundidade, onde o mecanismo de acomodação do solo proporcionou profundidade mínima de 2,7 cm e máxima de 5,5 cm, amplitude de 2,8 cm (Tabela 1). Já para os tratamentos com haste sulcadora desencontrada e disco duplo, a oscilação foi maior, com valores de 2,0 e 2,2 cm para profundidade mínima e 9,8 e 7,0 cm para a máxima, respectivamente.

A irregularidade na deposição de sementes em profundidade é um dos fatores que determinam a uniformidade de emergência e, consequentemente, a obtenção de um adequado estande inicial de plantas. Segundo Silva et al. (2008), sementes depositadas muito superficialmente correm o risco de não conseguir absorver a água necessária para completar o processo germinativo. Por outro lado, aquelas depositadas em profundidade excessiva podem demorar mais para emergir, ficando mais suscetíveis ao ataque de patógenos e pragas, bem como aos efeitos adversos de precipitações elevadas, incluindo o selamento superficial. Quanto aos parâmetros de estabelecimento de plantas, o disco duplo em semeadura direta e a gradagem + disco duplo resultaram em menor índice de velocidade de emergência, menor porcentagem de emergência (44,6 e 56,7%, respectivamente) e estande inicial de plantas, quando comparados aos tratamentos com a utilização da haste sulcadora e da escarificação do solo. Em parte, tais resultados podem ser atribuídos à precipitação de 40 mm ocorrida nos dias que se seguiram a semeadura, a qual associada à manutenção da camada compactada podem ter ampliado o período de tempo em que as sementes ficaram sujeitas a limitação de oxigênio durante o processo germinativo (Figura 4C e 4D).

Outro empecilho ao estabelecimento inicial das lavouras nesse ambiente tem sido a morte de plântulas ocasionadas por fungos de solo, principalmente por Phytophtora sojae, Rhizoctonia solani e Fusarium spp., os quais se beneficiam de condições de solo compactado e drenagem deficiente. No referido estudo, a utilização do disco duplo em semeadura direta favoreceu o aumento da porcentagem de plantas mortas, com valor de 19%. Por outro lado, quando se utilizou manejos do solo que possibilitaram a melhoria nas condições de fluxo de água e ar no perfil (haste sulcadora e escarificação), a porcentagem média de plantas mortas foi reduzida para valores inferiores a 5%.

A escolha de variedades com melhor comportamento em relação a doenças de solo é outro importante ponto a ser observado na busca de um adequado estande de plantas. Em estudo realizado por Prochnow et al. (2017), com 32 cultivares de soja em área de arroz com camada compactada, a morte de plantas variou de 0 a 36% em função do material genético, resultando em diferenças de produtividade de até 61%. No referido estudo, cabe destacar ainda que a morte de plantas foi sempre inferior na área escarificada em relação a não escarificada, independentemente da variedade utilizada, ou seja, é importante utilizar a variedade melhor adaptada ao ambiente, porém, sempre associada à melhoria do ambiente de desenvolvimento radicular.

 

3 Adequação da parte física do solo e o desenvolvimento de plantas

Ao longo de quase 10 anos de experiências e estudos desenvolvidos em campo, a média dos resultados tem mostrado que o êxito do cultivo da soja em áreas de arroz é respaldado dentre outros aspectos (nivelamento da área, drenagem, escolha de cultivar...) pela melhoria do ambiente de desenvolvimento radicular, com foco nos parâmetros físicos do solo, mas, sem esquecer dos químicos (fertilidade e pH).

Nesse sentido, cerca de 55% das áreas de várzea do estado do RS são compostas por Planossolos (BAMBERG et al., 2009), os quais apresentam como característica comum a formação de um ambiente hidromórfico, associado a uma densidade natural elevada (GOMES et al., 2006). Aliado a isso, o preparo das áreas para o cultivo do arroz irrigado, o qual em muitos casos ocorre sob condições de umidade inadequada, tem proporcionado o agravamento das limitações físicas desses solos, acarretando na formação de uma camada com elevado grau de compactação próxima à superfície (MUNARETO et al., 2010).

Para Gupta et al. (1989), a compactação pode ser definida como um processo decorrente da intensa manipulação do solo, a qual resulta na diminuição da sua porosidade natural, com a consequente redução do volume.

Como resultado, diversos parâmetros são afetados, dentre eles, podese destacar a redução da macroporosidade e da porosidade total (HU et al., 2018), da condutividade hidráulica (DRESCHER et al., 2017), da permeabilidade ao ar (GUBIANI et al., 2018), quebra da continuidade dos espaços porosos (BJORKLUND et al., 2016) e o aumento da resistência à penetração mecânica (HENRY et al., 2018).

Em resposta a essas alterações, restrições são impostas ao desenvolvimento do sistema radicular da soja, visto que a habilidade das plantas em explorar o perfil do solo decresce com o aumento da resistência à penetração mecânica associada à redução da capacidade do solo em realizar trocas gasosas (WATANABE et al., 2000). Como consequência, as plantas ficam mais sujeitas aos estresses hídricos.

A restrição de oxigênio ao sistema radicular das plantas, dentre outros prejuízos, provoca a inibição da atividade metabólica devido ao bloqueio da fosforilação oxidativa das mitocôndrias, ou seja, a planta produz menos energia (TAIZ et al., 2018). Concomitantemente, ocorre a inibição do processo de transporte de íons, inviabilizando a absorção de água e nutrientes pelo sistema radicular (SAIRAM et al., 2008). Na sequência, a reduzida difusão de oxigênio afeta a eficiência do processo de fixação biológica de nitrogênio (FBN), visto que o mesmo demanda elevada quantidade de energia para fixar o nitrogênio atmosférico.

No outro extremo, a restrição ao desenvolvimento de raízes em profundidade, por limitar o volume de solo e consequentemente de água a ser explorado pelas plantas, pode potencializar o período de tempo em que as mesmas passam em déficit hídrico, especialmente sob condições de precipitações irregulares. Em função da molécula da água estar envolvida em praticamente todos os processos fisiológicos e bioquímicos das plantas (TAIZ et al., 2018), sob circunstâncias de estresse pode ocorrer a redução da taxa fotossintética, do índice de área foliar, aceleração da abscisão de folhas e a redução da eficiência do processo de FBN em função da menor atividade da enzima nitrato redutase (TINT et al., 2011).

Assim, melhorar o ambiente de desenvolvimento de raízes é crucial na tentativa de se estabelecer uma lavoura com menos riscos. Para isso, identificar a presença ou não de camada compactada, bem como, quando presente, sua profundidade e espessura, são pontos cruciais e nos darão o embasamento necessário para a tomada de decisão correta em relação ao manejo.

Nessa perspectiva, as áreas de condução dos experimentos do GPAI, na média, apresentam resistência mecânica à penetração superior a 2 MPa já a 0,1 m de profundidade (Figuras 1 e 2), valor esse considerado na literatura frequentemente como restritivo ao desenvolvimento de raízes. Ademais, na camada de 0,1 a 0,2 m, outros parâmetros físicos do solo têm se mostrado igualmente inapropriados ao desenvolvimento da soja, com destaque para a elevada densidade (entre 1,5 e 1,6 Mg m-3), reduzida macroporosidade (<10%) e baixa condutividade hidráulica do solo saturado (<2mm h-1).

O rompimento da camada de maior restrição física, dentre outros equipamentos, pode ser realizado através da própria semeadora adubadora. Nesse sentido, a haste sulcadora tem apresentado resultados satisfatórios na melhoria do ambiente de desenvolvimento de raízes na linha de semeadura quando os estresses não são muito grandes, possibilitando o aumento da taxa de infiltração de água, da macorporosidade e na redução da resistência à penetração mecânica (Figura 1 e 2). Como consequência, a mesma tem viabilizado o desenvolvimento de raízes em profundidade de até 0,20m, possibilitando também maior número de nódulos, índice de área foliar e massa seca de raízes quando comparada ao sistema de disco duplo e disco turbo.

Além disso, as características da camada compactada, bem como a profundidade de atuação da haste sulcadora são determinantes na sua eficiência. Em trabalho realizado por Coelho (2017), a haste sulcadora a 0,23 m de profundidade resultou em acréscimo de 580 kg ha-1 na produtividade de grãos quando comparada a haste sulcadora a 0,13 m (Figura 3).

A utilização de escarificadores e subsoladores são outras opções para a descompactação do solo. Esses equipamentos tem como peculiaridade a atuação em maior profundidade, sendo sua eficiência associada às particularidades do equipamento e a umidade do solo no momento da operação. De acordo com Nunes et al. (2014), a escarificação quando realizada com solo friável e em profundidade adequada, possibilita a melhoria dos atributos físicos do mesmo, resultando no aumento da macroporosidade e da permeabilidade do solo à água e ao ar. Contudo, o elevado custo energético (RODRIGUES, 2015), associado à efemeridade de seus benefícios são alguns dos fatores limitantes à sua utilização (FIN et al., 2018). Além disso, a dificuldade de operacionalizar a escarificação em umidade adequada durante o período de outono/inverno em áreas de cultivo de arroz é outro desafio, e deve ser melhor compreendido.

Em trabalho realizado pelo grupo GPAI, a utilização do escarificador na entressafra proporcionou maior mobilização do solo em profundidade quando comparada a haste sulcadora, visto que esta última atenuou as limitações físicas do solo apenas na linha de semeadura. Como consequência, no sistema com escarificação, em todo o perfil de solo analisado, a resistência à penetração mecânica não ultrapassou 1,5 MPa (Figura 1C), o que proporcionou melhor distribuição do sistema radicular da soja quando comparado a haste sulcadora e ao disco duplo (Figura 1). Em trabalho realizado por Marchesan et al. (2016) em área de arroz compactada, a escarificação do solo promoveu o aumento da produtividade de grãos em relação a área não escarificada em 23%, ou 869 kg ha-1. Segundo os autores, esse incremento está relacionado fundamentalmente à redução da resistência à penetração em profundidade, a qual na área escarificada resultou em maior desenvolvimento radicular e acúmulo de nitrogênio (32%), fósforo (26,7) e potássio (28%) no tecido vegetal das plantas.

Sartori et al. (2016) citam ainda que a escarificação reduz a densidade e eleva a macroporosidade do solo na camada de 0,1 a 0,2 m de profundidade, aumentando a taxa de infiltração de água em 18% quando comparado a haste sulcadora e 49% em relação ao disco duplo. Como consequência do aumento do fluxo de água no perfil do solo, menor é o período de tempo em que as plantas passam sob o estresse hídrico por deficiência de oxigênio, melhorando o desenvolvimento radicular, a nodulação, a absorção de nutrientes e por consequência, a produtividade de grãos (Figura 2C e D).

A utilização de camalhões é outra maneira de tentar reduzir estresses as plantas de soja em áreas de arroz. Dentre suas peculiaridades, destacam-se os diferentes formatos e épocas de confecção, podendo ser implantados durante a entressafra, em período de menor demanda de máquinas e mão de obra na propriedade, ou concomitantemente à semeadura.

Quando associado à haste sulcadora, o sistema tem sido reportado na literatura por reduzir a mortalidade de plântulas durante a emergência, aumentar a eficiência da fixação biológica de nitrogênio (FIN et al., 2018) e atenuar os problemas de ordem física do solo (SARTORI et al., 2016). Ainda segundo Gubiani et al. (2018), em área de arroz compactada em subsuperfície, a utilização de camalhões associada a escarificação possibilita que a cultura da soja permaneça maior período de tempo durante seu ciclo sob condições ótimas de umidade do solo, quando comparado ao sistema sem camalhões e sem escarificação.

A utilização dos camalhões representa ainda uma oportunidade não somente de drenar de forma mais eficiente e ágil a lavoura durante períodos de elevada precipitação, mas também de irrigar a cultura com maior velocidade e segurança em momentos de deficiência hídrica. Cassol (2018) avaliando os sistemas de implantação da soja com e sem camalhão, associado ou não a irrigação por superfície, verificou que a utilização do camalhão no sistema sem irrigação resultou no incremento da população inicial de plantas, da massa seca de nódulos, do teor de N-ureídos e da produtividade de grãos (12%) quando comparado ao sistema sem camalhão. Cabe destacar ainda, que nos tratamentos com irrigação (duas irrigações entre R2 e R5.1), a utilização do camalhão aumentou a produtividade de grãos em 561 kg ha-1 em relação ao sistema irrigado com solo plano, além de apresentar uso mais eficiente da água da irrigação.

 

4 Considerações finais

O cultivo da soja em rotação com o arroz irrigado representa uma oportunidade impar para os produtores dessas áreas. Sob o ponto de vista de controle de plantas daninhas, significa a possiblidade reconverter para o sistema produtivo áreas infestadas com arroz vermelho resistente. Com relação à renda, surge como opção de aumento do fluxo de caixa, oportunizando a comercialização do produto com melhor preço, maximizando o lucro.

Contudo, diversos são os desafios para a produção de soja nesse ambiente. O primeiro ponto a ser observado refere-se à escolha da área, a qual deve ser feita de modo a proporcionar os menores riscos possíveis, principalmente com relação ao alagamento por período excessivo. O perfeito nivelamento de superfície, associado a um sistema de drenagem eficiente, dentro e fora da lavoura, são pontos cruciais para o sucesso da lavoura, e que trarão também benefícios para o arroz irrigado na sequência. O passo seguinte refere-se à identificação da presença ou não de camada compactada, bem como, qual profundidade e espessura da mesma, pois esses dados irão fornecer o embasamento necessário para a tomada de decisão em relação ao manejo.

Quando presente, essa camada com elevado grau de compactação afeta o desenvolvimento das plantas, com foco no sistema radicular. A limitação da exploração do perfil do solo em profundidade deixa as plantas mais suscetíveis aos estresses hídricos, limitando os processos de absorção de água e aeração do sistema radicular, refletindo-se na assimilação de nutrientes, nodulação e consequentemente produtividade de grãos.

A utilização da haste sulcadora (em profundidade adequada) na semeadora surge como uma boa opção, pois além de possibilitar a melhoria do ambiente de desenvolvimento radicular e dos processos fisiológicos da planta, é feito em operação única, reduzindo custos de preparo do solo. Quando essa for a opção mais adequada, a associação de um mecanismo de acomodação do solo é importante para que se viabilize um adequado estabelecimento inicial da lavoura. Manejos com maior mobilização do solo, como a escarificação devem ser adotados com cautela, levando em consideração a disponibilidade do equipamento e as características da camada compactada. Quando esse for o caso, a utilização de uma planta de cobertura na entressafra é uma alternativa para viabilizar que os benefícios na estrutura do solo oriundos da escarificação persistam por mais de uma safra, diluindo custos e operações.

Por fim, cabe lembrar que o planejamento prévio da propriedade para receber culturas alternativas ao arroz irrigado é primordial para o sucesso do sistema de rotação. Associado a isso, o aprimoramento das técnicas de cultivo deve vir acompanhado do treinamento e capacitação da equipe, visando atender da melhor maneira possível às exigências desse novo cultivo.